Todas as vantagens do setor público, a começar pela estabilidade no emprego, mais a possibilidade de enriquecer advogando em uma banca privada, sem precisar cumprir carga horária como em outras funções. Um emprego assim existe em Porto Alegre e pode ficar ainda mais atraente se a Câmara Municipal aprovar o projeto que deveria ter sido votado na semana passada mas foi retirado de pauta por divergências entre os vereadores da base aliada. O cargo em questão é o de procurador do município.
A proposta de reestruturação da Procuradoria-Geral do Município, enviada à Câmara pelo prefeito José Fortunati, deverá ser apreciada na próxima semana. Como o repórter Carlos Rollsing mostrou em reportagem de ZH, as resistências não se limitam à liberação para atuar paralelamente em um escritório privado, exceto nas ações contra a prefeitura. Essa possibilidade já existe: está apenas sendo regulamentada.
O aumento do salário inicial dos procuradores, de R$ 12,5 mil para R$ 15,7 mil, e o teto de R$ 30,4 mil (quase o dobro do salário do prefeito) também são focos de indignação entre os vereadores da oposição e os governistas contrários ao projeto, já que para a maioria dos servidores municipais a situação é de arrocho.
O projeto regulamenta a Lei 701, de julho de 2012, que instituiu a Lei Orgânica da PGM e incluiu um “jabuti”: a transformação de 81 assessores jurídicos em procuradores, sem a realização de seleção pública. O procurador do Ministério Público de Contas, Geraldo da Camino, entrou com representação, pedindo a anulação dessas “promoções”, porque ferem o princípio do acesso aos cargos por concurso público.
Defensores do projeto alegam que não se trata de uma aberração, como a coluna definiu na edição de ontem: procuradores municipais em todo o Brasil já têm direito a exercer a advocacia privada e a União estuda liberar os seus. Em 22 unidades da federação, os procuradores estaduais também podem advogar para clientes particulares. No Rio Grande do Sul, a PGE ainda exige dedicação exclusiva. Outro argumento é que servidores de outras carreiras, como médicos, arquitetos e engenheiros podem atuar em escritórios ou consultórios privados.
Ainda que a liberdade para o duplo exercício da atividade esteja prevista no estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), vamos combinar que se trata de um privilégio. Ninguém é obrigado a ser procurador municipal, estadual ou federal. Se optou por uma carreira de Estado, que a ela se dedique, como fazem juízes e promotores.
A exigência de não atuar em processos contra a prefeitura, prevista no projeto, não significa uma vacina capaz de evitar o conflito de interesses. O projeto não impede, por exemplo, que o procurador atue em escritórios que cuidam de ações contra a prefeitura.