O que, para mim, era uma sensação de repórter que estava em Brasília em 8 de janeiro de 2023 se confirma pelo relato rico em detalhes do então interventor federal Ricardo Cappelli no Timeline, da Rádio Gaúcha, na manhã desta quarta-feira (8), dois anos depois da tentativa de golpe: por muito pouco, na noite daquele domingo, tropas do Exército não entraram em confronto com o efetivo da polícia militar do Distrito Federal.
Dois blindados foram posicionados em frente ao acesso ao Setor Militar Norte, impedindo o avanço da PM até o acampamento em frente ao Quartel-General. Capelli descreveu que sua intenção era ingressar no local e prender os vândalos que haviam depredado o Congresso Nacional, o Planalto e o Supremo Tribunal Federal.
Naquele momento, houve um diálogo duro entre ele e o então comandante do Comando Militar do Planalto, general Gustavo Henrique Dutra.
— Chamei o coronel Fábio Augusto, que era então comandante da Polícia Militar do Distrito Federal, e disse a ele que preparasse a tropa, porque íamos entrar e prender todo mundo. Ele recebeu o comando, ficou muito assustado e se afastou de mim. Naquele momento, ele fez uma ligação para o então comandante militar do Planalto, o general Dutra. E aí ele volta pra mim e fala: "Olha, o general Dutra quer conversar com o senhor, pediu pro senhor ir para torre de TV".
Cappelli então conversa com Dutra:
— O general Dutra chegou e foi nesse momento em que o Exército começou a movimentar tropas e esses blindados. Eu tive uma discussão muito dura com o general Dutra, muito respeitosa, com respeito mútuo, mas muito dura. Eu disse que ia prender todo mundo. Ele me disse que, se eu entrasse com as tropas naquele momento, a gente corria o risco de ter um banho de sangue. Eu perguntei: Banho de sangue por quê? Você está me dizendo que o Exército Brasileiro tá protegendo homens armados que atentaram contra a democracia?
Capelli, protagonista dos fatos daquele dia, contou, em outro trecho da entrevista, mais detalhes de bastidores pouco conhecidos do ataque de 8 de Janeiro. A um certo momento, ele passou pela linha de proteção estabelecida pelo Exército e foi até o QG. Ele subiu até o gabinete do comandante do Exército, general Júlio César de Arruda, que estava acompanhado de integrantes do Alto Comando do Exército:
— Subimos até a sala do Alto Comando e, quando a gente senta, o general Arruda vira para mim e fala: "O senhor iria entrar com tropas ali sem a minha autorização?
Nesse momento, Cappelli afirma:
— General, eu ia lhe avisar.
Nesse momento, Arruda afirma:
— Porque eu acho que tenho um pouquinho mais de tropas que o senhor.