Ninguém imaginava que a tecnológica, inovadora e democrática Coreia do Sul pudesse enfrentar um processo de instabilidade política grave como o deflagrado nesta terça-feira (3) pelo presidente Yoon Suk-yeol, que declarou lei marcial no país, suspendendo direitos civis, e, horas depois, recuou.
Mais do que uma turbulência interna, a crise transborda para além da Península Coreana devido à posição estratégica e geopolítica sul-coreana - e por suas alianças e seus adversários regionais e globais.
A Coreia do Sul é aliada-chave dos Estados Unidos na região: faz fronteira com a cada vez mais ameaçadora Coreia do Norte, nação que vem municiando de arsenal nuclear e com o qual os sul-coreanos ainda estão tecnicamente em guerra (o conflito entre 1950 e 1953 não foi concluído com acordo de paz). Aliás, a fronteira entre os dois países, o famoso "paralelo 38), é uma das mais perigosas do mundo.
Os Estados Unidos mantêm ali posicionadas algumas de suas principais bases na Ásia, entre elas Camp Humphreys, a maior unidade militar fora do território americano, com efetivo de 41 mil pessoas.
Outro ingrediente explosivo: a Coreia do Sul e os Estados Unidos contam com um acordo de defesa mútua, o que significa que, se um for atacado, automaticamente deve receber o apoio do outro.
A Coreia do Sul também faz parte de um trio de países, composto ainda por Japão e Filipinas, estratégicos para os interesses americanos na região - não só em relação às intenções do ditador Kim Jong-un e suas aspirações atômicas, mas sobre a proteção de Taiwan em relação à China.
Ou seja, o país é um ator indispensável na projeção do poder americano na região, que vem se deteriorando nos últimos anos em razão da ascensão da China, o maior interessado na surpreendente instabilidade sul-coreana atual.