O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Um conflito iniciado há 13 anos, durante as manifestações de 2011, no contexto da Primavera Árabe, voltou a ganhar força no início desta semana, quando uma ofensiva jihadista tomou Aleppo, a segunda maior cidade da Síria. O fato pegou de surpresa tanto o governo sírio quanto os analistas internacionais, já que não houve um estopim claro quanto ao motivo do ataque.
Ainda na semana passada, membros do grupo Hayat Tahrir al-Sham lançaram ataques ao norte e noroeste de Aleppo. Nos dias 29 e 30, invadiram a cidade e forçaram a saída das forças governamentais.
— É um dos grupos tradicionais desde o início da guerra. Eles cresceram, se fortaleceram, se reorganizaram e hoje são um grande guarda-chuva de diferentes grupos militares, opositores ao governo sírio. Então, essa grande coalizão de diferentes grupos militares acabou criando essa nova frente armada da oposição síria, que conseguiu concretizar essa ofensiva surpresa — explica Issam Menem, doutor em estudos estratégicos internacionais e pesquisador do Núcleo de Pesquisa sobre as Relações Internacionais do Mundo Árabe, vinculado à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
De um lado, Rússia e Irã têm influência sobre áreas controladas pelo governo. Do outro, os Estados Unidos têm forças no nordeste e leste do país, apoiando as Forças Democráticas Sírias, lideradas pelos curdos. Já a Turquia tem tropas no noroeste, controlado pelos rebeldes jihadistas. O conflito também se alastra por outras guerras do Oriente Médio, já que o Hezbollah, apoiado pelo Irã, ajudou Bashar al-Assad, presidente da Síria, a recuperar Aleppo em 2016.
— Acredito que estamos observando, nesta semana, a guerra iniciar uma nova fase do conflito. Depois de anos, observamos a evolução desse conflito para uma grande escala novamente, em que milhares de combatentes serão engajados e, como estamos vendo, inúmeras mortes sendo anunciadas todos os dias.
Logo após os ataques, o governo sírio afirmou que irá revidar.
— Há um contra-ataque do governo sírio, tanto pela Rússia quanto pelo Irã. O governo sírio não abrirá mão da sua segunda maior cidade, que é Aleppo, um símbolo cultural da Síria, e com certeza tentará retomar o controle da região.
O que olhar daqui para frente?
No Oriente Médio, os conflitos não se restringem às suas fronteiras e podem sim se misturar. Segundo Menem, o novo conflito pode influenciar a dinâmica interna e dos países fronteiriços, especialmente com a Turquia, o Iraque e o Líbano.
— A retomada de um conflito em grande escala pode desestabilizar novamente a administração do governo sírio, levando a uma nova onda de crise econômica, social e política para Damasco (capital da Síria). Nesse sentido, outra questão que devemos nos atentar é o fortalecimento de grupos extremistas na região e como esses grupos podem acabar se fortalecendo novamente, atuando fora das fronteiras.
Para o doutor, o novo evento pode gerar uma crise securitária, política e econômica, não só para a Síria, mas para toda a região.