Ao longo das mais de 30 horas de prorrogação da COP29, até que se alcançasse a assinatura do documento final, negociadores, observadores, ambientalistas e jornalistas aqui em Baku chegaram a acreditar na frase "no deal is better than a bad deal" (em português, "nenhum acordo é melhor do que um acordo ruim") A expressão norteou, em alguns momentos, a estratégia de negociação intramuros da COP, por exemplo, quando os países-ilhas, aqueles que sofrem primeiro os efeitos mais dramáticos das mudanças climáticas e que correm risco de desaparecer, deixaram a sala para demonstrar sua insatisfação. Foram seguidos por 45 países menos desenvolvidos. Àquela altura, a meta de financiamento climático (NCQG) expressa no rascunho era de US$ 250 bi anuais.
O espectro do fracasso pairou sobre Baku nessas 30 horas. Não que adiamentos nunca tenham ocorrido - é bem comum a declaração final não chegar ao mesmo tempo que se encerra o prazo regulamentar - afinal, não é fácil alcançar consenso entre interesses tão díspares de mais de 190 países. Em Madri, na COP25, o texto final só saiu depois de quase 44 horas além do tempo normal.
No entanto, o que mais preocupa em Baku é a sensação, ao fecharem-se as cortinas, de que o racha no sistema internacional nunca antes foi tão profundo na história das COPs quanto agora. Três anos de discussões e duas últimas semanas a portas fechadas, no Estádio Olímpico, pareciam ter sido insuficientes para que se chegasse a um acordo. Mas não era esse o caso. Simplesmente, os países em desenvolvimento desembarcaram no Azerbaijão decididos a bloquear a qualquer custo o aumento da meta. Tanto que uma cifra só apareceu no texto do documento no último dia, na sexta-feira (21). Tanto tempo desperdiçado, dinheiro gasto e carbono emitido para quê?
Ao final, houve um acordo ruim ("bad deal"). Os US$ 300 bilhões anuais estão muito aquém do necessário, segundo a própria ONU para medidas de adaptação e transição energética que garantam que a temperatura do planeta fique limitada a 1,5°C, segundo previsto pelo Acordo de Paris. Pior do que isso: não há garantia alguma de que as nações desenvolvidas irão desembolsar esse valor. Já não o fazem desde 2009.
Muitas nações em desenvolvimento, como a Índia, deixam o Azerbaijão visivelmente irritadas com o que parece ser uma "esmola" dada pelas nações ricas, como se tudo o que foi discutido desde a Rio92 sobre "responsabilidades comuns, porém diferenciadas" fosse letra morta.
O cenário é ainda mais tenebroso diante um contexto geopolítico que, se já era complexo, tende a piorar, com a volta de Donald Trump ao poder, nos Estados Unidos, e o recrudescimento das guerras na Ucrânia e no Oriente Médio.
O fracasso não é total em Baku (porque diferentemente do que se pensou, ao longo dos altos e baixos das últimas horas, um acordo ruim é ainda melhor do que não tê-lo). Mas o caminho até a COP de Belém será suado, uma vez que há a expectativa de países em desenvolvimento trabalharem para se chegar, em algum momento, aos US$ 1,3 trilhão anuais, a meta ideal na avaliação da ONU e de especialistas. A COP da Amazônia colocará à prova, como em poucas vezes na história, a capacidade da diplomacia brasileira de evitar o colapso do diálogo para o clima. Em Baku, isso não ocorreu por muito pouco.