
Quem acompanha essa coluna sabe que meus olhos de repórter já testemunharam algumas tragédias mundo afora. O Katrina, em 2005, em New Orleans, foi, talvez, o desastre que vi, fora do Brasil, mais semelhante ao que o Rio Grande do Sul viveu nas últimas semanas. Mas experienciei também os dias seguintes ao grande terremoto no Peru, em 2007, e a catástrofe no Haiti, em 2010, os efeitos dos atentados terroristas de Paris, em 2015, e cinco guerras. Por isso, desde os primeiros dias do tenebroso maio de 2024, amigos, colegas e leitores passaram a me perguntar:
– Como é, para ti, cobrir uma tragédia na tua terra?
A resposta contém algumas variações, a depender do tempo do interlocutor. Mas, em geral, digo:
– É completamente diferente.
No Rio Grande, o meu Estado, e em Porto Alegre, a minha cidade, residem meus familiares, amigos e colegas. Escolhi o RS para viver. Mesmo viajando bastante, minha imagem preferida é aquela da janela do avião prestes a pousar no Salgado Filho: o horizonte de morros e águas da Capital.
Nos primeiros dias da Porto Alegre alagada, naveguei de bote pelo Centro Histórico. Reconheci lugares por onde passeava na infância, lamentei a destruição de palcos históricos e culturais e, sobretudo, ao fechar os olhos, rememorei cada rua outrora cheia de gente e vida.
Quando cubro um fato triste no Exterior, busco retratar o horror de populações com o objetivo de chamar a atenção para aquela tragédia, denuncio violações de direitos humanos, busco traduzir aquele sofrimento para nosso público a fim de criar empatia, laços comuns – até porque os dramas (e sonhos) humanos são muito parecidos aqui no RS, em Porto Príncipe ou em New Orleans.
Entretanto, quando a tragédia fala português – ou gauchês – é diferente. É tudo isso e muito mais. Há uma responsabilidade implícita, tácita, com a nossa gente. Não é maior ou menor do que em outros casos, mas é diferente. Temos, como profissionais de imprensa, a obrigação de contribuir para a retomada das atividades econômicas e a reconstrução do Estado. Só assim garantiremos emprego e qualidade de vida para os gaúchos.
Esse senso de responsabilidade, no entanto, só faz sentido se transformado em ação. Sairemos diferentes desse desastre nos agarrando àquilo que temos em essência – heroísmo, bravura e criatividade –, aprendendo com quem veio de fora – com a solidariedade gigantesca dos brasileiros, a quem somos gratos – e inspirando-nos em quem também já mergulhou no fundo do poço e saiu de lá, como os exemplos de New Orleans pós-Katrina, Nova York pós-Sandy, Fukushima pós-tsunami, entre outras Fênix por aí – e há muitas.
Porto Alegre vai voltar a ser a capital brasileira do South Summit, polo de negócios e inovação, terra de grandes eventos, cenários de finais do futebol sul-americano e, por que não, a cidade que tem o mais belo pôr do sol do globo, ainda que hoje olhemos para aquele horizonte com algum receio. Vai passar. E, nessa jornada, essa coluna se propõe a ser hub de diálogo construtivo, posto vigilante de cobranças e crítica a eventuais desvios e, sobretudo, porta-voz de sugestões e soluções por um Estado melhor. Pra cima, Rio Grande!