Há vários aspectos geopolíticos por trás da decisão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep+), puxada por Arábia Saudita e Rússia, de reduzir a produção em mais de 1 milhão de barris por dia.
No caso saudita, a um primeiro olhar, o corte pode ser entendido como uma retaliação aos Estados Unidos. A ditadura árabe é tradicional aliada americana no Oriente Médio, uma aliança construída na base do "inimigo do meu inimigo é meu amigo", no caso em oposição a outra potência regional, o Irã xiita.
Entretanto, para os sauditas, essa parceria já não está tão sólida: os árabes não gostaram, no ano passado, de uma ação dos EUA que pressionou o reino a bombear mais petróleo para tentar controlar a inflação em meio ao aumento dos custos de energia por causa da guerra entre Rússia e Ucrânia. E, agora, a Arábia Saudita está irritada porque o governo de Joe Biden descartou novas compras de petróleo para restabelecer o estoque estratégico que foi esgotado no ano passado.
Mas essa é apenas parte da história. Há uma segunda camada do ponto de vista geopolítico. Aos poucos, a Arábia Saudita está indo para o lado da Rússia, em uma tentativa de criar problemas para Biden. O reino é mais próximo dos republicanos (e amavam Donald Trump) porque os democratas são mais críticos em relação às violações aos direitos humanos no país.
E há ainda uma terceira camada. A Arábia Saudita está percebendo que pode sobreviver de forma mais independente em relação aos Estados Unidos, inclusive exportando mais petróleo para a China. Os sauditas estão prestes a ingressar em um bloco econômico e de segurança asiático chamado Organização de Cooperação de Xangai, formado principalmente por antigos países do bloco soviético, hoje liderado pela China. Isso afasta os sauditas ainda mais da esfera de influência americana.
A China tem entrado pesado no Oriente Médio e foi inclusive a fiadora do acordo histórico de semanas atrás entre a Arábia Saudita e o Irã. Normalmente, esse papel era exercido pelos Estados Unidos, senhores da paz e da guerra na região.
Não é mais assim. O acordo mediado pela China foi um tapa na cara de Washington. O recado é: o mundo não é mais unipolar, como nos acostumamos a ver desde o fim da Guerra Fria. Será multipolar no futuro? É desejável. Mas, antes, talvez volte a ser bipolar, com a China ocupando o espaço exercido, antes, pela URSS.