Os movimentos antivacina, que nos últimos dias provocam algum barulho à medida que a Europa ampliou o cerco aos não imunizados contra a covid-19, têm diversos rostos e variam conforme as motivações e a localização geográfica.
Desde o fim de semana, manifestações têm ocorrido contra as restrições, os novos confinamentos e as exigências de vacinação obrigatória em países como Áustria, Holanda, Bélgica, Dinamarca, Itália, Irlanda do Norte e Croácia - em alguns locais com violência, como em Roterdã, onde estabelecimentos foram vandalizados.
Em menos intensidade, esses protestos já ocorriam nos Estados Unidos, onde autoridades de alguns Estados ensaiaram medidas mais restritivas, mas essas foram barradas na Justiça.
Na Europa, as motivações para os protestos são diferentes de acordo com o país. Por um lado, há interesses e posições individuais - de quem tem negócios e está sendo atingido, de novo, pelas restrições (na Holanda, o governo impôs novo lockdown parcial junto com uma série de restrições sanitárias, especialmente no setor de bares e restaurantes, que voltaram a fechar às 10h) até quem está, simplesmente, cansado depois de quase dois anos de intervenções estatais sobre a vida cotidiana.
Mas as ações orquestradas, como os grandes protestos do fim de semana em Viena (Áustria) e as manifestações que há quatro dias sacodem a Holanda e a Bélgica, têm como pano de fundo o aspecto político. Em alguns locais, manifestantes exibiam cartazes indicando que a vacinação obrigatória, definida pelo governo austríaco, por exemplo, seria uma atitude fascista. A denúncia partia do Partido pela Liberdade (FPO), ironicamente um grupo de extrema-direita e xenófobo.
Na França, pessoas têm falsificado atestados de vacinação, chegando a pagar entre 250 e 500 euros por um documento falso. Na Grécia, chegou-se a descobrir um esquema criminoso que envolvia a aplicação de água em vez do imunizante por parte de médicos que embolsavam propina para atender aos pedidos de pacientes. Entre cem e 200 centros de vacinação gregos participaram do esquema.
Na Romênia, a onda antivacina fez a mortalidade por covid-19 disparar. Com um forte movimento antivacina, só 44% da população está imunizada com duas doses. É a pior taxa do continente. Pastores, políticos e influenciadores digitais estão por trás desse percentual, uma vez que fazem constantemente declarações contrárias à vacinação.
Esse fenômeno se repete em outras nações do Leste Europeu, como Bulgária, Letônia e Ucrânia. Nessas nações, o passado de governos autoritários comunistas faz com que populações ainda hoje desconfiem de informações governamentais.
No geral, os grupos, antes marginais, se tornaram caixa de ressonância de teorias conspiratórias, o que acaba unindo movimentos - ou parte deles - tão díspares quanto os Coletes Amarelos, os libertários e os grupos New Age. A mensagem é ecoada por apoiadores da extrema-direita à extrema-esquerda.
Na Espanha e em Portugal, países com altos índices de vacinação, os movimentos antivacina não tem impacto importante.
Nos EUA, o epicentro do movimento antivacina é o Bible Belt, o centurão bíblico do sul do país - onde estão localizados Estados com forte influência cristã protestante. A pandemia ficou cada vez mais politizada à medida que Estados controlados por republicanos se opõem às tentativas do governo Joe Biden de vacinar a população. Na Flórida, por exemplo, o governador Ron DeSantis está apostando que a aversão às restrições para conter o coronavírus aumentará sua base política e manterá os eleitores engajados até 2022, quando haverá eleições para o Congresso. O mesmo tem ocorrido no Texas, onde deputados locais estão canalizando os desejos de ativistas que se opõem à vacinação sob pretextos de promover a liberdade. Esses movimentos contam com o apoio das alas mais radicais do Partido Republicando, como a alt-right (direita alternativa).
Na Austrália, milhares de pessoas se manifestaram contra as leis em várias cidades nos últimos dias. A França acionou forças especiais para o território ultramarino de Guadalupe, no Caribe, após dias de agitação.