Há motivos de sobra para se prestar atenção na eleição presidencial no Peru neste domingo (6).
Primeiro: é o país com o maior número de mortes por covid-19 na proporção a sua população (5.538 por 1 milhão de habitantes).
Segundo: todos os seis últimos presidentes estão ou estiveram com problemas com a Justiça - quatro deles devido aos elos com a empreiteira brasileira Odebrecht (Alejandro Toledo, Alan García, Ollanta Humala e Pedro Pablo Kuczynski). Um deles, García, se matou quando a polícia chegou a sua casa para detê-lo, em 2019. Toledo está ameaçado de extradição pelos EUA, Humala ficou detido por 10 meses e Kuczynski está em prisão domiciliar. No escândalo mais recente, Martín Vizcarra, que assumiu por ser vice de Kuczynski, foi afastado depois que vieram a tona casos de corrupção do tempo em que era governador. Em uma crise institucional sem precedentes, com ausência do presidente e do vice, assumiu Manuel Merino, que ficou só cinco dias no cargo. É acusado de homicídio e ferimentos de manifestantes que exigiam sua saída.
Não bastassem esses episódios rocambolescos, o país chega ao pleito deste domingo em meio a um cenário que a nós é familiar: a polarização política entre direita e esquerda. E com fantasmas do passado autoritário da América Latina como um todo e do Peru em Particular, carga herdada pela candidata Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori - que, aliás, também cumpre pena de 25 anos de reclusão por crimes contra a humanidade.
A senadora, que prometeu indultar o pai caso seja eleita, disputa o poder com Pedro Castillo, representante da esquerda que ficou à frente de 18 candidatos no primeiro turno. As pesquisas mostram empate técnico: Castillo com 42,6% dos votos contra 41,7% de Keiko, que reduziu a diferença nas últimas semanas.
Se Keiko representa, para a esquerda, o que há de pior na direita - autoritarismo, empoderamento da oligarquia, neoliberalismo e ecos do fujimorismo, Castillo significa, para a direita, o pior da esquerda: nacionalização dos setores energéticos, como os de minas, gás e petróleo, nova Constituição que dê maior papel ao Estado como regulador do mercado e semelhanças com Hugo Chávez.
Se Fujimori, o pai, ficou conhecido por derrotar o grupo extremista Sendero Luminoso, com práticas de violações aos direitos humanos, Castillo é acusado por adversários de ter ligações com remanescentes da organização, algo que ele nega.
A saída, para o eleitor, deve ser o famoso "menos pior", expressão comum na política latino-americana nos últimos anos. Os rostos parecem novos, mas, na verdade, o Peru está preso ao passado.