Um dos dois representantes brasileiros no parlamento da Itália, o deputado Luis Roberto Lorenzato, da Liga, partido liderado por Matteo Salvini, de extrema-direita, rejeita a vitória do “Sim” ao corte de 345 deputados no parlamento (hoje, são 945), aprovada em referendo no domingo. Ítalo-brasileiros puderam votar a partir do Exterior. A redução afetará representantes eleitos fora da Itália, que passarão de 18 (12 deputados e oito senadores) para 12 (oito deputados e quatro senadores).
Lorenzato, natural de Orlândia, São Paulo, foi eleito em 2018, com Fausto Longo, do Partido Democrático (PD, de centro-esquerda), como representantes da América do Sul no parlamento italiano.
Na entrevista a seguir, ele comenta o atual cenário político italiano e como a redução no número de parlamentares pode impactar na representatividade dos ítalo-brasileiros no momento em que se discute um projeto que limita a transmissão da cidadania italiana por direito de sangue somente para descendentes de segundo ou primeiro graus. Hoje, no Rio Grande do Sul, há 85 mil pessoas com cidadania reconhecida.
O que significa essa redução do número de parlamentares?
A ideia de fazer o corte no parlamento é cavalo de batalha do Movimento 5 Estrelas (antissistema). Obviamente, todo mundo quer reforma. O problema é que você tem de fazer uma reforma geral. Já que vai fazer uma reforma da Constituição, uma cláusula pétrea, tem de fazer uma reforma substancial. Houve corte de parlamentares, mas não no funcionalismo público das duas casas. Tem funcionário público que ganha mais do que deputado e senador. São três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário, são três pernas que seguram a República. Você pega uma delas e corta 30% da perna, fica um toquinho. Perde o equilibro. Nunca votei no parlamento a favor desse corte. Apoiei o “Não”. O erro foi não ter feito um corte em todos os cargos de todos os três poderes. Mas a Liga apoiou o corte inicialmente. Ela votou favorável ao corte, sim.
Foi uma decisão pessoal votar pelo “Não”?
Foi pessoal. A imprensa mundial fala que somos de extrema-direita. Mas cada um vota de acordo com a consciência, ninguém é obrigado. Mais uma prova de que a Liga não é de extrema-direita. É um partido de centro-direita. Teve ministro que votou contra.
Por que queriam uma reforma mais ampla?
Queríamos uma reforma igualitária. Para todo o lado. Aqui no Brasil, Bolsonaro cortou 40 mil cargos. Isso é fazer uma economia. Na época em que estávamos no governo, votamos e aprovamos (o corte), mas queríamos uma reforma complexa depois. Mudou o governo, e ficou só um pedaço para votar no referendo. O caminho de mudança foi frustrado.
Como a redução de deputados e senadores pode atingir a representatividade dos ítalo-brasileiros?
O Brasil tem mais italianos descendentes do que a Argentina, é o dobro. Só que eles têm três vezes mais italianos legalizados (com cidadania reconhecida) nos consulados. Então, eles têm três vezes mais poder de volta. Enquanto em Buenos Aires não tem fila, é fácil fazer cidadania, em São Paulo, Porto Alegre, Curitiba demora 10, 15 anos. Existe essa dificuldade. A possibilidade do colégio eleitoral na América do Sul é de fazer (deputados) todos argentinos. Por isso, a comunidade italiana no Brasil poderá perder representatividade.
Reduzir parlamentares é algo bastante popular – o senhor diria que é populista.
O salário mínimo na Itália é de mil euros (R$ 6,5 mil). E eles veem um deputado que ganha 10 mil euros (R$ 65 mil) e falam: “Ah, vamos cortar isso daí”. Só que o deputado na Itália não tem um real de verba para destinar, não tem auxílio residência. Ele paga aluguel. Só ganha passagem de trem e de avião. Até alimentação no parlamento é cobrado. Não é essa mordomia que as pessoas acham.
As pessoas no Brasil votaram com o pensamento no parlamentar brasileiro e com certa rejeição que existe com relação aos políticos?
Exatamente. Por exemplo, a nossa secretária é dividida por seis deputados. Funcionária da Liga, não da Câmara. Loucura, né? O meu gabinete dividido com outro deputado, sem banheiro.
E essa ideia de redução da geração com direito à cidadania?
Todo ano o PD e o 5 Estrelas tentam, na lei de orçamento, enfiar no meio das emendas, uma lei para poder voltar para segundo grau. Somente o neto é italiano (teriam direito à cidadania). O bisneto não é. Minhas filhas passariam a não ser. Eu não seria. Eles têm maioria para aprovar isso. Se você é italiano e tem um filho, ele é italiano. O que vai ser o filho dele? Italiano. No Brasil também é assim. Não dá para pôr limite. Hoje é automático. O que mais irrita é que ninguém na Itália quer mudar essa lei. É no Exterior que estão forçando a barra.
A Liga é de extrema-direita e xenófoba. Vocês são xenófobos?
Não, o único senador negro da Europa é da Liga. O Rio Grande do Sul tem algum senador negro?
Sim, Paulo Paim, do PT.
São Paulo não tem senador negro. Então São Paulo é xenófobo? Não posso dizer que São Paulo é xenófobo, porque não tem nenhum senador negro?
As manifestações de Salvini contribuíram para essa visão? O senhor o conhece?
Muito, meu amigo. Fiz uma conexão agora, levei agora o líder de Portugal da “extrema-direita”, igual ao que falam, “xenófoba e racista”, que tem um motorista que é africano, assessor que é gay, de Israel, para encontrar o Salvini. É uma loucura. Como alguém é nazista, como o Bolsonaro, e é amigo do Netanyahu (Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel), que é judeu? Não combina. Então, eles falam a extrema-direita. A gente fala extrema-imprensa. Não é correto. Somos contra ilegalidade. Somos contra a imigração ilegal.