A convenção do Partido Democrata entra nesta quarta-feira (19) no terceiro dia, o penúltimo. Os discursos mais esperados são de Barack Obama, afinal, a eleição parece ter se tornado um duelo pessoal entre o ex-presidente e Donald Trump, e Kamala Harris, a vice na chapa de Joe Biden. A coluna preparou um resumo do que de mais curioso ocorreu desde o início do evento, na segunda-feira (17).
1 Perde-se muito na convenção por transmissão remota. O evento estava previsto para ocorrer em Milwaukee, Wisconsin, mas acabou sendo adotado o formato virtual devido à pandemia. Não se tem a energia da multidão, os aplausos, balões caindo, momentos engraçados. Tudo fica mais insípido. Mas não é só questão de formato: Wisconsin, onde ocorreria a convenção presencial, é um dos campos de batalha da eleição, aqueles Estados-chaves que decidem (swing states) o pleito. Sediar a reunião poderia desequilibrar a balança para o lado democrata.
2 A questão racial foi bastante explorada no primeiro dia. A prefeita de Washington, Muriel Bowser, falou tendo como fundo a BlackLivesMatter Plaza, seção de dois quarteirões da 16th Street, na capital americana, que mudou de nome desde a morte de George Floyd e dos protestos que eclodiram a partir do episódio. Os familiares de Floyd gravaram um vídeo.
3 Entre as falas políticas até agora, sem dúvida, o pronunciamento de Michelle Obama foi o que provocou mais repercussão - pela força , energia, trajetória, pelo cargo que ocupou, pela admiração que provoca entre os eleitores democratas e, claro, pelas críticas que fez a Trump. Ela deixou a moderação habitual de lado e partiu para o ataque direto. Na terça-feira (18), o presidente passou boa parte do dia reagindo à fala de Michelle. Em um dos eventos sobre os 100 anos do voto feminino nos EUA do qual participou, Trump disse que ela "perdeu a cabeça".
4 Excetuando-se os pronunciamentos políticos, houve momentos de emoção, em que cidadãos comuns foram chamados a dar seus testemunhos - uma estratégia que ambos os partidos costumam usar para tentar aproximar a eleição da população em geral, muitas vezes distantes da alta política. Em um desses momentos, uma jovem cujo pai era eleitor de Trump e morreu em decorrência do coronavírus, afirmou:
- Sua única doença pré-existente do meu pai era acreditar em Donald Trump. E por isso pagou com a vida.
5 Os republicamos que viraram a casaca também foi uma forma de tentar convencer eleitores de que o fenômeno Trump seria passageiro e que nem o próprio partido do presidente o apoiaria em 2020. O mais famoso dos políticos é John Kasich, ex-governador de Ohio (2011 a 2019), um dos swing states.
6 O papel da ala progressista do partido foi diminuída propositalmente. Bernie Sanders, o principal representante do setor e que concorreu com Biden nas prévias, falou no mesmo dia de Michelle - logo, teve o brilho ofuscado pela ex-primeira-dama. Na terça-feira (18), foi reservado apenas um minuto para Alexandria Ocasio-Cortez, nome em ascensão nas fileiras democratas. Foi uma tentativa de não afastar os eleitores de centro-direita e de centro.
7 Jill Biden, mulher do candidato, foi muito bem no segundo dia, ao apresentar o marido, equilibrando momentos de decisão do ex-vice de Obama e dificuldades familiares pelas quais passou, que humanizaram o político. Foi salientada sua resiliência - Biden ficou viúvo aos 30 anos, quando a então mulher e a filha mais nova, de 18 meses, morreram em um acidente de carro. Em 2015, ele perdeu o filho mais velho devido a um câncer no cérebro.
8 Por mais que o partido tente apresentar-se como uma legenda que se renovou a partir da derrota de 2016 - e com um discurso conectado com o século 20 -, não havia como negar espaço a figuras antigas. É esse equilíbrio que motiva o eleitor tradicional a votar (em eleição polarizada em que o voto é facultativo). Bill Clinton, o presidente entre 1993 e 2001, Jimmy Carter, ex-presidente mais velho ainda vivo dos EUA (governou entre 1977 e 1981), e John Kerry, candidato à presidência em 2004 (perdeu para George W. Bush) cumpriram esse papel de trazer experiência e serenidade à narrativa. A imagem de Clinton, acusado de ter um caso extraconjugal com a estagiária da Casa Branca enquanto estava na presidência, entretanto não ajuda muito na retórica democrata de igualdade e na conquista do voto feminino. Ainda assim, ele é um dos melhores oradores do partido.
9 A oficialização do nome de Biden, na terça-feira (18), embora tenha sido uma mera formalidade, foi o primeiro grande momento do candidato durante a convenção. Ele deixou para falar aos eleitores na quinta-feira (20), quando terá todas as atenções voltadas a ele.
10 As convenções tanto republicana quanto democrata são desenhadas de forma que o clima vá esquentando dia após dia, até o ponto máximo, com a fala do candidato, no último dia. Entretanto, como esta é uma eleição um tanto plebiscitária - entre um modelo antigo, dos democratas, tendo o ex-vice à frente de uma das chapas, e o mandato atual, de Trump -, o terceiro dia promete um clímax. Isso graças ao protagonismo dos que terão a palavra: Barack Obama e Kamala Harris, a vice de Biden. Será interessante observar se o ex-presidente adotará um tom moderado, com críticas indiretas ao republicano, ou se partirá para o ataque. Kamala é conhecida por energizar a plateia com sua fala. Também vale conferir.