Sleeping Giants (Gigantes Adormecidos) é um dos grupos mais atuantes na campanha Stop Hate for Profit, que levou marcas globais a deixaram de anunciar em redes sociais, em especial no Facebook. Nas últimas semanas, mais de 400 multinacionais aderiram ao movimento contra discursos de ódio, racistas e notícias falsas nas plataformas digitais.
Desde o anúncio das gigantes americanas, o braço brasileiro do movimento tem pressionado as filiais dessas empresas por meio de publicações no Twitter a também deixarem de anunciar nas redes sociais. O grupo, que nasceu há quatro anos nos Estados Unidos, chegou ao país em maio. No perfil, criado em 18 daquele mês, apresenta-se como "uma luta coletiva de cidadãos contra o financiamento do discurso de ódio e das Fake News".
Em pouco mais de um mês de atuação, o administrador da conta brasileira, que mantém o anonimato, estima ter impedido a captação de cerca de R$ 448 mil por parte de sites que promovem notícias falsas e discursos de ódio. Para tanto, replica o modelo americano de pressão: identifica a publicidade de grandes marcas em sites que publicam fake news, printa as páginas e joga nas redes sociais, marcando as empresas e pedindo que removam o anúncio para, dessa forma, desmonetizar esses canais.
Nos Estados Unidos, o criador do grupo, o publicitário Matt Rivitz, 47 anos, teve como primeiro alvo o site de extrema-direita Breitbart News, que teve um prejuízo de 8 milhões de euros em publicidade após a campanha da entidade. O ex-diretor do site é Steve Bannon, ex-estrategista de campanha do presidente Donald Trump e com contatos com integrantes do governo de Jair Bolsonaro. No Brasil, uma campanha deflagrada pelo perfil levou o Banco do Brasil, por ordem do Tribunal de Contas da União (TCU), a suspender parte de suas campanhas digitais em sites, blogs e redes sociais após denúncia do Ministério Público de Contas (MPC).
Sleeping Giants Brasil contabiliza 375,7 mil seguidores, mais do que a conta original, nos Estados Unidos (305 mil). O administrador da conta brasileira conversou com a coluna por meio de mensagens diretas no Twitter, canal que considerou mais seguro para o diálogo. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Vocês acreditam que grandes marcas 100% nacionais aderirão ao boicote às redes sociais, a exemplo do fenômeno nos EUA?
Não só acreditamos como estamos trabalhando para isso, esperamos despertar a consciência das empresas brasileiras do poder que têm nas mãos ao anunciar em determinados lugares e do prejuízo que se pode fazer à democracia brasileira se continuarmos contribuindo com portais que promovem a desinformação e discursos de ódio.
Vocês têm articulação com Sleeping Giants nos EUA e contato com o fundador do movimento, Matt Rivitz? Têm seu aval para operar em nome da organização americana no Brasil?
Temos, Matt nos oficializou no segundo dia de perfil ativo, hoje temos contato e nos "espelhamos" um no outro, somos parte de um mesmo coletivo, independente do país de atuação.
Que diferenças vocês acham que vão ocorrer na adesão ao Stop Hate for Profit no Brasil em relação ao que vimos nos EUA?
Esperamos que o Facebook não ignore nossos clamores, afinal a desinformação e o preconceito também atinge (e muito) as democracias do Sul. Ansiamos por novas medidas para que o discurso de ódio e a desinformação não estejam presentes de maneira corriqueira dentro das plataformas, essas ferramentas não devem ser mais toleradas.
Por que vocês não se identificam? O que temem?
Prezamos por nossas identidades anônimas por questões de segurança. O Sleeping Giants Brasil é um movimento que afeta diretamente o bolso de pessoas que se utilizam de notícias falsas e discursos de ódio para lucrar. Tememos ataques e ameaças, como aconteceu com Matt Rivitz quando teve sua identidade vazada nos EUA.
Que tipo de fake news vocês identificam nas redes sociais ou discurso de ódio associado às marcas no Brasil?
As fake news sempre existiram, mas não há como negar que, nos últimos anos, foram fortemente usadas como armas realmente perigosas em prol de ganhos políticos. Já o discurso de ódio também sempre foi presente. É inacreditável que em 2020 as pessoas ainda promovam o preconceito e o ódio direcionado a certas pessoas, minorias, povos e etc e ainda lucrem com esses meios.
Vocês têm alguma ligação com algum partido político brasileiro?
Não, o movimento é completamente apartidário, inclusive reiteramos que as fake news são propagadas por diferentes espectros políticos, mas nossos alvos são escolhidos com base na proporção, relevância e alcance dos portais atualmente. É interessante ressaltar também que nossa "aderência" ao #StopHateForProfit, além das motivações do movimento original (a desinformação e o ódio dentro das plataformas), muito se deve a passividade das plataformas. O Facebook, por exemplo, retirou seu banner fixo do nosso primeiro site alvo, o Jornal da Cidade Online (acusado de disseminar fake news). Porém, continua cedendo espaço dentro da rede social para o site ganhar cerca de R$ 30.000 com anúncios. Ou seja, a plataforma reconheceu que o site era duvidoso, porém segue sem ações contra o lucro do portal dentro da própria plataforma. Isso é realmente preocupante. Precisamos despertar a consciência de que a plataforma está contribuindo para que as notícias falsas ganhem voz.