O ato número 1 da política externa do novo governo, o encontro entre o presidente Jair Bolsonaro e o secretário de Estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, em Brasília, ganhou as manchetes ontem pela frase de efeito do novo inquilino do Planalto:
– Tem havido longa tradição no Brasil de eleger presidentes que por alguma razão eram inimigos dos Estados Unidos. Agora é o contrário, somos amigos.
Palavras gentis fazem parte do vocabulário da diplomacia. Mas equivoca-se o presidente ao imaginar que, em algum momento, a política externa brasileira considerou inimigo os Estados Unidos – segundo maior parceiro comercial e por muito tempo o primeiro. A história nos lembra que a relação entre sucessivos presidentes foi ora de alinhamento automático, durante a II Guerra Mundial com Getúlio Vargas, e na sequência com Juscelino Kubitschek e nos primeiros anos do regime militar, ora de maior distanciamento, nos mandatos de João Goulart, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Mas, mesmo durante períodos glaciais das relações, nunca houve confrontação ou rompimento – muito menos, a Casa Branca foi tratada como inimiga.
O antiamericanismo expresso na queima de bandeiras dos Estados Unidos por aqui no início dos anos 2000 era direcionado a um governo específico, o de George W. Bush, e sua decisão de fazer a guerra contra o Iraque, passando por cima do sistema internacional. Protestos semelhantes ocorriam em outras partes do mundo. Manifestações populares, não política de Estado.
Mesmo no momento mais sensível entre os dois países, com a descoberta de que a Agência de Segurança Nacional (NSA) havia espionado 29 telefones do governo petista – entre ministros, diplomatas, assessores e da própria Dilma –, os EUA estiveram longe de ser considerados inimigos.
Foi um presidente americano, Barack Obama, que chamou Lula de “o cara”.
Foi durante o governo Dilma que o mesmo presidente anunciou a abertura de novos consulados no Brasil – inclusive o de Porto Alegre – e diminuiu entraves para a entrada de turistas brasileiros em seu território.
Interesse em aquecer a economia americana pós-crise de 2008? Sim, nos negócios ou na diplomacia de países adultos, não há amigos ou inimigos. O que existem são negócios, interesses, parcerias de ocasião e muito pragmatismo.