Poucos assuntos mexem tanto com nossas fobias mais abissais quanto a morte em um submarino. O ar vai rareando aos poucos, e você está encapsulado, no escuro, dentro de uma estrutura que, em minutos, irá se transformar no seu sarcófago de aço a 907 metros de profundidade.
Se você já prendeu a respiração ao se imaginar nesta cena, pense no que anda pela mente de familiares e amigos dos 44 marinheiros do ARA San Juan, desde sábado.
Seus queridos estão mortos, não havia dúvidas. Mas, pior do que a morte, é não ter o corpo para sepultar. Os argentinos, protagonistas de uma das mais cruéis ditaduras do Cone Sul, sabem o que é esperar por alguém que não vai voltar. “Desaparecidos” é uma palavra que ainda grita nos muros de Buenos Aires e no silêncio enlouquecedor das Mães e Avós da Praça de Maio.
Só por isso o governo de Mauricio Macri já teria motivos para trazer os destroços do submarino de volta. Mas há outras razões que tornam este um dever moral. A tragédia é símbolo do sucateamento da marinha argentina, resultado de sucessivos cortes de gastos nos governos Néstor e Cristina Kirchner. O naufrágio, por razões ainda inexplicadas, foi um golpe no combalido brio dos hermanos, que até hoje reivindicam as Malvinas (Falklands), depois da humilhação da guerra em que seu principal navio, o cruzador General Belgrano, foi afundado, sua frota naval foi recuada aos portos e até hoje muitos corpos de soldados permanecem no arquipélago britânico – como os do ARA San Juan, não puderam voltar para casa.
O governo argentino não tem condições de retirar do fundo do mar a estrutura de 2 mil toneladas – que, com a água no interior, está pesando bem mais. Mas a História mostra que operações de resgate desse tipo, embora caras, complexas e sob risco altíssimo, são possíveis. Dependem, é claro, de fatores como as condições em que o submarino se encontra no solo marítimo, dos ventos e das ondas na superfície, da capacidade técnica e da tecnologia para suportar à enorme pressão. Se tudo der certo, ainda há o perigo de a estrutura não suportar ao içamento e se romper, como aliás, já ocorreu nos anos 1970.
Conhecimento e espírito de cooperação internacional levaram a humanidade a resgatar 33 homens das profundezas da mina San José, no Chile, e a salvar 12 crianças e seu treinador de futebol na caverna na Tailândia. Mas tudo isso não é suficiente sem boa vontade.