Dois dos presidentes mais moderninhos da atualidade estarão em Moscou para ver a final de suas seleções no domingo. Não é novidade suas presenças nos jogos da Copa: a presidente da Croácia, Kolinda Grabar-Kitarovic, faz sucesso misturada a torcedores no Mundial e pagando suas viagens com o próprio dinheiro, mas é conservadora em relação a costumes como homossexualidade.
O francês Emmanuel Macron também é um habitué dos estádios — estava na arquibancada em São Petersburgo na vitória da seleção da França contra a Bélgica, na terça-feira, apesar do boicote diplomático do Ocidente à Rússia por conta da tentativa de assassinato de um ex-espião russo em uma cidade do Reino Unido, em março. No domingo, inclusive, Macron irá se reunir com o presidente Vladimir Putin — antes ou depois da final.
Kolinda, moderna nos estádios, mas conservadora nos hábitos
Kolinda Grabar-Kitarovic, 50 anos, presidente da Croácia, ficou conhecida na Copa pelo estilo despojado da chefe de Estado, primeira mulher a comandar o jovem país do Leste Europeu, nascido do esfacelamento da Iugoslávia em 1991. Entre nós, pouco acostumados com gestos de transparência de políticos, também chamou atenção o fato de a presidente ter descontado os dias de folga de seu salário, viajado em voo comercial e pago ingressos do próprio bolso. Kolinda compartilhou a imagem (veja abaixo) em que aparece no avião ao lado de vários torcedores, com a legenda "vamos para a vitória". Ela estava a caminho de Nizhny Novgorod para assistir à partida entre Croácia e Dinamarca, em 1º de julho.
É estilo, mas toda a exposição midiática também pode ter uma intenção estratégica. Eleita em 2015 com 50,54% dos votos, em uma eleição apertada contra o social-democrata e então presidente Josipovic, Kolinda integra uma coalizão de oito partidos liderada pelo maior, a União Democrática Croata (HDZ). Esta legenda, quando no poder entre 2003 e 2009, esteve envolvida nos maiores escândalos de corrupção do país. Em 2013, em uma sentença judicial, a legenda foi qualificada de "organização criminosa" e seu ex-primeiro-ministro Ivo Sanader foi preso.
Kolinda representa uma nova era do partido e da política croata. Como Emmanuel Macron, é tida como "outsider".
Antes de se tornar presidente, seguia carreira diplomática como embaixadora da Croácia em Washington entre 2008 e 2011, ministra para Integração Europeia e ministra das Relações Exteriores e exerceu alto cargo na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Aliás, antes da reunião de cúpula da aliança militar em Bruxelas, horas antes de a Croácia derrotar o Reino Unido por 2 a 1 e se classificar para a final, na quarta-feira, ela presenteou a primeira-ministra britânica Thereza May com uma camisa da seleção croata.
Considerada da ala moderada de seu partido conservador, é católica e contraditória em questões sociais. Ela se manifesta a favor do aborto, mas é contra o casamento gay —embora, durante sua campanha, em 2014, tenha dito que apoiaria caso um dos filhos se assumisse como homossexual. Ela também disse que autorizaria o uso medicinal da maconha. Kolinda é casada desde 1996 com Jacov Kitarovic, engenheiro naval, com quem tem dois filhos: Katarina, 17 anos, patinadora no gelo, campeã juvenil da Croácia, e Luka, 15 anos. Aliás, enquanto a família morava em Washington, tempo em que Kolina era embaixadora, seu marido foi flagrado usando o carro diplomático em atividades privadas. Ela encerrou a polêmica assumindo as despesas.
A economia da Croácia saiu em 2015 de uma recessão que durou seis anos, nos quais acumulou uma contração de 12%. A dívida pública representa 80% do Produto Interno Bruto (PIB). O desemprego ainda é um dos principais desafios - ronda os 16%. Diferentemente da França, onde o sistema de governo é semi-presidencialista (o primeiro-ministro é Edouard Philippe), na Croácia vigora o parlamentarismo — logo, Kolinda tem poderes limitados. Ela é comandante supremo das forças armadas e administra junto ao governo a política exterior. O cargo de primeiro-ministro é ocupado por Andrej Plenkovic.
Macron, o ex-banqueiro queridinho da Europa que se considera "liberal de esquerda"
Aos 40 anos, presidente mais jovem da história da França, Emmanuel Macron é o queridinho da Europa, muitas vezes comparado a Barack Obama francês. Sua campanha, em 2017, se assemelhava muito com a do democrata americano: seu partido En Marche! era a grande surpresa do pleito. Uma de suas máximas era dizer que o partido não era nem de esquerda nem de direita. Era uma tentativa de se distanciar dos dois partidos tradicionais da política francesa: o Socialista e o Republicanos, que, pela primeira vez desde 1958, ficou fora do Palácio do Eliseu.
A imagem política de Macron gira em torno da ideia de que ele é um "outsider", alheio à classe tradicional política. Até o início da campanha, Macron era desconhecido do mundo — e, de certa forma, até na própria França, onde foi ministro da Economia. É um centrista liberal, pró-mercado e forte defensor da União Europeia.
Estudante de Amiens, Macron chegou certa vez para a professora de teatro Brigitte Trogneux, propondo que os dois escrevessem juntos uma peça para o último ano de aulas.
— Ele não era como os outros. Ele não era um adolescente. Tinha uma relação de igual para igual com outros adultos — afirmou ela a um documentário francês em 2016.
Aos 16 anos, Macron deixou Amiens para terminar os estudos em Paris (ele formou-se na Escola Nacional de Administração), com a ideia de um dia se casar com sua antiga professora. Brigitte era 24 anos mais velha do que Macron, casada e com três filhos. Mas deixou o marido e começou uma relação com o ex-aluno. Ambos se casaram em 2007.
Após a universidade, ele conviveu de perto com membros da elite política e econômica, e enriqueceu trabalhando em um banco de investimentos, o Rothschild & Cie, onde acumulou pouco mais de 3 milhões de euros em quatro anos — o que leva muitos a questionarem quando ele se declara um político antissistema. Na verdade, Macron é um liberal de esquerda, algo novo na política francesa.
No ano passado, com apenas quatro meses no poder, ele assinou cinco decretos que implementam a reforma trabalhista, a fim de flexibilizar as leis de trabalho na França, uma das promessas de campanha. Houve protestos e sua popularidade caiu: de 66% quando assumiu para 45%. Ainda assim, é mais alta do que seus dois antecessores, Nicolas Sarkozy e François Hollande — tem sido um presidente reformador e ao mesmo tempo popular, o que não significa que não seja contestado. Para muitos, seu estilo de governar passa longe da imagem de moderninho. Ele vem sendo criticado por sua postura distante da realidade do francês médio, o que leva a oposição a muitas vezes a compará-lo ao imperador Napoleão Bonaparte.
Em nível internacional, fez uma dobradinha com a chanceler alemã Angela Merkel em oposição a políticas isolacionistas dos EUA, mas, nos bastidores pode-se perceber uma disputa por quem irá liderar a União Europeia (UE). A França é a terceira economia do continente.
Os looks de Macron também permitem comparação com Obama: cheio de estilo, costuma usar gravatas slim, colarinho italiano e ternos justos, que deixam o punho das camisas à mostra.