“Espero que a escolha nas eleições afaste o governo militar e nos faça regressar à constitucionalidade”. A frase, acreditem, é de Robert Mugabe, o ditador que, ao longo de quase quatro décadas, assaltou o Zimbábue, país africano que chegou a ter uma inflação anual de 231.000.000%. Pasmem, o tirano, do alto de seus 94 anos, veio falar em “constitucionalidade” pouco antes antes da primeira eleição sem que seu nome estivesse na cédula.
Último dinossauro entre os rebeldes africanos transmutados em ditadores, Mugabe foi o ausente ainda presente da eleição. Sua voz influencia. Mas, sem o ditador, o pleito desta segunda-feira foi mais colorido como colorido sabe ser o Zimbábue.
Mugabe governou durante 37 anos à margem da lei. Ou, melhor dizendo, ele próprio era a lei. Até ser apeado do poder no final do ano passado por seu próprio partido, o Congresso da União Nacional Africana do Zimbábue-Frente Nacional (Zanu-PF), pelos militares e pelo vice, Emmerson Mnangawa, agora candidato.
O que o fez pedir a volta da “constitucionalidade”? Não foi, por certo, um espasmo de democracia. Foi desejo de vingança. Não votaria naqueles que o tiraram do palácio, argumentou. O ex-ditador escolheu a oposição, de Nelson Chamisa e seu Movimento para a Mudança Democrática (MDC), que têm poucas chances, mas cujo apoio cresceu recentemente.
O processo eleitoral está cheio de denúncias de irregularidades. O resultado só deve sair após o dia 4, e não há garantias de que um ou outro lado irá aceitar a voz das urnas. Mas as imagens de eleitores comemorando o primeiro voto, em Harare, ou as cenas de filas quilométricas no interior do país são daquelas que emocionam. Uma democracia, ainda que imperfeita, é sempre o melhor sistema.
Ganhe quem ganhar, Mugabe seguirá sendo um fantasma pairando sobre o Zimbábue. Mas, felizmente, é cada vez mais invisível.