Os gulags de Fidel Castro se chamavam Unidades Militares de Ayuda a la Producción, mais conhecidas como Umap. A exemplo de seus mentores soviéticos, el comandante
mantinha, nos anos 1960, campos de trabalho forçado para onde era enviados desafetos da Revolução, em outras palavras, criminosos comuns, dissidentes políticos, claro, mas também religiosos (o marxismo, em tese, é ateu) e gays. Sessenta anos depois, alterar a Constituição para permitir o casamento entre homossexuais é, por si só, uma mudança histórica para deixar, de vez, para trás um dos capítulos mais truculentos da ditadura castrista. Mas há muito mais vindo por aí no verão com ares de primavera cubana.
Sem desejar muito alarde internacional, o governo tem apresentado o anteprojeto de nova Carta Magda como simples adaptação de linguagem à nova fase de continuidade revolucionária. Mas não se trata de mera questão gramatical. A se confirmar, a Constituição, que irá a consulta popular entre agosto e novembro e cujo anteprojeto foi aprovado no fim de semana pelo Politburo cubano, será a maior transformação histórica da Ilha desde a Revolução de 1959. O conjunto de leis vigentes, promulgado em 1976 e redigida à imagem e semelhança das Cartas do bloco socialista, prevê, em seu artigo 5, o objetivo do “avanço rumo à sociedade comunista”. Com a reforma constitucional, essa ideia desaparece junto com a proibição do casamento homossexual.
Ou seja, estamos falando de nada mais nada menos do que o adeus ao ideário comunismo.
Esse processo começou quando Fidel ainda estava vivo, curtindo a aposentadoria no bairro de Siboney, em Havana. Era 2011, e seu irmão, Raúl Castro dava início a uma alteração gradual que permitiria alavancar a economia, as chamadas Diretrizes da Política Econômica e Social do VI Congresso do Partido Comunista de Cuba. Aos poucos, os pilares do sistema foram sendo substituídos. De lá pra cá, os Castro saíram da presidência, o tecnocrata Miguel Díaz-Canel assumiu e o país caminhou para uma abertura sem precedentes ao investimento externo e um processo de liberalização controlada do modelo marxista-leninista que culminará no fim do ano no reconhecimento da iniciativa privada – o passo prático que sepulta o comunismo.
No caso do casamento gay, a evolução ocorreu em grande parte pelo esforço pessoal de Mariela Castro Espín, filha de Raúl e sobrinha de Fidel, que se transformou em ícone internacional da ilha não pelo sobrenome, mas pela militância em favor do direito à diversidade sexual. Por exemplo, desde 2007, o dia contra a homofobia é comemorado em Cuba, em 17 de maio, e governo se encarrega gratuitamente das operações de mudança de sexo.
Enquanto nações como a Nicarágua, do dinossauro político Daniel Ortega, mergulha no autoritarismo, e a Venezuela implode enquanto país, Cuba dá exemplo de adaptação – e sobrevivência – no século 21.
Entre mudar e morrer, o regime escolheu a primeira opção.