Ainda que se possa duvidar de seus interesses, o príncipe saudita Mohammed bin Salman é a principal novidade em um Oriente Médio de desgastados personagens. Em entrevista ao editor-chefe da revista The Atlantic, Jeffrey Goldberg , MbS, como é conhecido, diz aceitar a existência de Israel, algo que poucos líderes árabes admitiriam:
– Cada povo, em qualquer lugar, tem o direito de viver em sua nação pacificamente. Acredito que os palestinos e os israelenses têm o direito de ter sua própria terra.
A posição revela duas questões: por um lado, os árabes em geral e os sauditas em particular estão cansados das autoridades palestinas, de sua desorganização, corrupção e incapacidade quase cúmplice de conter grupos extremistas. Por outro, a diplomacia do dinheiro, sacramentada na viagem de Donald Trump ao reino no ano passado, colhe os primeiros frutos. O reconhecimento de Israel é uma das exigências da Casa Branca, que tem no genro judeu do presidente americano, Jared Kushner, diplomata em chefe.
Na entrevista, Salman reafirma seu ódio mortal ao todo-poderoso aiatolá Ali Khamenei:
– O líder supremo iraniano faz Hitler parecer bom. Hitler tentou conquistar a Europa. O líder supremo está tentando conquistar o mundo.
Antes de qualquer otimismo, é preciso ler a conversa com dois pés atrás. Primeiro porque a Casa dos Saud apoiou no passado grupos terroristas que hoje condena. Segundo porque a Arábia Saudita é uma monarquia feudal com desprezo absoluto por direitos humanos, uma insuperável intolerância religiosa e que se vê como última barreira diante da crescente influência do Irã xiita. Mais: é berço do wahabismo que manchou de sangue o Islã, cujo filho dileto desta facção é Osama bin Laden, terrorista que, aliás, manteve relações com a família real muito antes do 11 de Setembro.
O plano do príncipe saudita para modernizar o reino divide de forma simplista e perigosa o Oriente Médio: um “triângulo do mal”, que une Irã, Irmandade Muçulmana e grupos terroristas sunitas e uma aliança de Estados moderados, que inclui Jordânia, Egito, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Omã. A Arábia Saudita, claro, é líder desse “eixo” supostamente do bem.
Vale tudo para barrar o avanço do Irã e conquistar a hegemonia na miniguerra fria que alimenta os conflitos no Iraque e na Síria: bombardear os houthis no Iêmen (aliados dos aiatolás) e até abraçar antigos inimigos, como Israel.