O regime norte-coreano ultrapassou todos os limites, descumpriu resoluções das Nações Unidas e provocou adversários como poucas vezes se viu nas últimas décadas: 16 testes com mísseis (um novo estaria em gestação nesta segunda-feira), dois deles com suposta capacidade para atingir o território continental dos EUA e um que sobrevoou o espaço aéreo japonês; e, no domingo, a detonação de uma suposta bomba de hidrogênio, mais potente do que as explosões em Hiroshima e Nagasaki.
Que fique claro: as sanções econômicas impostas pela comunidade internacional, as resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU) e as ameaças virtuais de Donald Trump não funcionaram para demover o governo de Kim Jong-un da intenção de tornar a Coreia do Norte uma potência atômica. Tampouco funcionaram manobras dissuasivas, como o sobrevoo de caças na fronteira entre as duas Coreias e o deslocamento de frota naval para a região.
Paralelamente ao intrincado jogo político até a guerra, parte dele jogado nesta segunda-feira na ONU, em Nova York, generais americanos, em Washington, debruçam-se sobre opções militares. E pouco concluem. Diferentemente de aventuras recentes americanas em Iraque, Afeganistão, Líbia e Síria, não há alternativas de baixo impacto para agir na Coreia do Norte, a despeito das afirmações do secretário de Defesa americano, James Mattis, no domingo.
A Península Coreana não é o Oriente Médio ou a Ásia Central, onde os EUA fomentaram grupos de oposição internos e contaram com o apoio logístico de vizinhos – o Paquistão, no caso do Afeganistão, e a Jordânia e a Turquia, no caso do Iraque. A Coreia do Sul, principal aliado americano na região, não quer a guerra e não irá servir de cabeça de ponte para uma invasão do Norte por medo de ser aniquilada em poucos minutos.
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No caso coreano, as distâncias de bases estratégicas americanas amplificam o problema logístico. Para um ataque dos EUA, seriam necessários voos de B-2 e B-52, que partiriam da Ilha de Guam, e ofensivas com caças F-22, que decolariam de porta-aviões. Mas, diferentemente do Iraque e do Afeganistão, onde a força aérea inimiga sequer saiu do chão, a Coreia do Norte dispõe de radares supostamente capazes de identificar aeronaves "não-stealth" (não invisíveis), caso do B-52. Nenhuma chuva de bombas sobre a Coreia do Norte começaria sem os famosos mísseis Tomahawk, disparados de navios ou submarinos. O deslocamento de carros de combate para a Coreia do Sul, ao mesmo tempo em que poderia servir como novo gesto de dissuasão, será visto como provocação pelos norte-coreanos (indicativo de uma invasão terrestre) e apressaria um ataque sul-coreano.
Qualquer ataque irá cobrar um preço altíssimo em vidas. Metrópoles como Seul, com 9,8 milhões de habitantes, e Tóquio, com 9,2 milhões, estão perto demais da Coreia do Norte. Uma ação americana põe civis sul-coreanos e japoneses na alça de mira de Kim, que não precisa de armas nucleares para atingi-los. Basta munição convencional. E há milhares enterradas próximo à zona desmilitarizada, a quatro quilômetros da fronteira com a Coreia do Sul.