Quando o mundo ainda estava aturdido pelos atentados que inauguraram, em 11 de setembro de 2001, a era do terror de massa, nos Estados Unidos, os ataques em Madri revelaram que a Europa não estava imune. Era 11 de março de 2004, quando 192 pessoas morreram e 2 mil ficaram feridas nas explosões na estação de Atocha e em trens próximos.
À época, o então primeiro-ministro espanhol, José María Aznar, do Partido Popular (conservador), perdeu a eleição depois de uma trapalhada declaração na qual evitava a relação entre os ataques e a participação da Espanha na coalizão que invadiu o Iraque de Saddam Hussein. Ironia do destino, o país atualmente voltou a ser governado por um premier do PP, Mariano Rajoy, e a Espanha, de novo, participa de uma coalizão internacional, desta vez tendo como alvo o grupo extremista Estado Islâmico na Síria e no Iraque - argumento usado pelos terroristas para justificar o atentado a Barcelona nesta quarta-feira.
De 2004 pra cá, a Espanha havia feito a lição de casa. Usara sua experiência em combater o extremismo separatista do ETA no século 20 para tentar neutralizar o terrorismo islâmico do século 21. Cerca de 3 mil agentes passaram a atuar na prevenção a atentados, esquadrinhando bancos de dados, redes sociais, passaportes e monitorando voos para regiões conflagradas. Desde 2004, foram presos 600 suspeitos de terrorismo e 120 condenados. As medidas deram certo por 13 anos - até esta quarta-feira.
Uma das principais conclusões do extenso relatório sobre o 11 de setembro de 2001 foi que faltou imaginação aos americanos para preverem atentados como aqueles - que alguém colocaria 19 terroristas a bordo de aviões comerciais transformadas em mísseis, a tal guerra assimétrica no jargão militar. Não cabe dizer o mesmo, depois de oito atropelamentos em pontos turísticos europeus. Um ataque a Barcelona era provável. O modus operandi dos extremistas é claro desde Nice, em 14 de julho de 2016: atirar, indiscriminadamente, automóveis e vans contra pedestres.
Depois de Nice, Berlim, Estocolmo e Londres, de certa forma, a Espanha sabia que seria, em algum momento, atacada de novo. O alerta antiterrorismo havia sido elevado em junho de 2015 para o nível 4, o penúltimo na escala e que representa “risco elevado ou iminente”. Essa medida, mais um aprendizado dos atentados de 2004, significa, na prática, maior vigilância de infraestruturas consideradas alvo: estações de trens e metrô, aeroportos e usinas nucleares. Enquanto está em vigor o alerta 4, são ativadas todas as unidades policiais de prevenção, investigação e inteligência. Tudo isso não foi suficiente para evitar o horror em Barcelona.
A Europa não eliminará o terror com a mesma estratégia de luta contra o ETA e o IRA. Não apenas com armas nem com estratégias do passado. Tampouco fechando fronteiras, uma vez que ele nasce da exclusão social, principalmente de cidadãos que não se sentem inseridos na cultura ocidental. O extremismo germina no ventre europeu - e não no Oriente Médio ou no norte da África.
Como combatê-lo, então? Como trazer de volta aos aprazíveis bulevares franceses, às feirinhas de Natal alemãs e às Ramblas de Barcelona a tranquilidade que tínhamos até 2001? Uma das respostas é a mais provável: talvez nunca mais tenhamos esse cenário de volta. A outra é mais lógica: não se combate o terror apenas com bombas.