Do ponto de vista legal, a vitória da oposição no plebiscito realizado no final de semana na Venezuela não tem valor algum. Mas a grande participação, cerca de 7,6 milhões, em uma demonstração histórica de desobediência ao chavismo-madurismo, tem enorme potencial simbólico.
Criou um fato político com impacto internacional. As manchetes na mídia global nesta manhã, com fotos da participação em massa da população provocam reações de governantes mundo afora. No Panamá, o presidente Juan Carlos Varela, durante anos próximo de Hugo Chávez, declarou nesta manhã no Twitter que suspender a convocação da Assembleia Constituinte e escutar o povo são os únicos caminhos para alcançar a paz.
O plebiscito não foi autorizado pelo Conselho Nacional Eleitoral, o TSE venezuelano, só que controlado pelos chavistas. Logo, o processo não tem valor legal, mas serviu como mais um ingrediente na panela de pressão interna até o dia 30 de julho, data estipulada pelo governo para eleição da Assembleia Constituinte. Seu ganho é externo: revela um chavismo cambaleante.
Para ir às urnas, os venezuelanos venceram o medo dos chamados coletivos, grupos paramilitares chavistas que ameaçaram seções eleitorais. Mas nem a ação de uma dessas brigadas, que matou uma pessoa e feriu outras quatro, intimidou os eleitores.
A ideia de Nicolas Maduro é, com a Assembleia Constituinte, criar um Estado comunal, para aprofundar o projeto de seu antecessor, algo como um "pós-socialismo do século 21", diria o próprio Chávez. A Constituinte terá 545 cadeiras, metade ocupada por representantes escolhidos pelas comunas, conselhos controlados pelo partido governista. Ou seja, um jogo de cartas marcadas, desta vez dando amplos poderes aos representantes de um sistema semelhante ao da antiga URSS. Uma das medidas, por exemplo, seria a formalização desses coletivos que tentaram boicotar o plebiscito. Sob a nova Constituição, eles seria institucionalizados com papel de fazer o controle político da população.
Ou seja não é só pela Assembleia Constituinte que os venezuelanos votaram em massa. Foi pela escassez de comida, contra o caos institucional e pelo fim da era Chávez-Maduro. O governo pode não reconhecer a derrota, como, de fato, não reconheceu. Mas o recado ao mundo está dado.