A crise no Golfo Pérsico põe em lados opostos dois gigantes regionais, os maiores exportadores de petróleo, que lutam pela hegemonia local. De um lado, a Arábia Saudita, formada por população de maioria muçulmana sunita. De outro, o Irã, de maioria xiita. A grosso modo, é como se Brasil e Argentina entrassem em uma disputa pela influência na América Latina.
Sauditas e iranianos estão em lados opostos nos conflitos que ocorrem ali do lado, na Síria e no Iraque. A Arábia Saudita, tradicional aliado dos Estados Unidos na região, tem liderado uma grande coalizão de países islâmica contra o autoproclamado Estado Islâmico (EI). O Irã, por sua vez, não morre de amores pelos terroristas do EI (que aliás, são de origem sunita, rival deles no âmbito religioso), mas não quer a saída do ditador Bashar al-Assad _ algo que os sauditas já disseram que deve ocorrer por bem ou por mal.
1) Que países romperam relações com o Catar?
São seis: Arábia Saudita, Bahrein, Egito, Emirados Árabes Unidos e Iêmen.
2) Quando começou?
As rivalidades são antigas, mas a situação ficou insustentável depois da visita de Donald Trump à região, há duas semanas. Em reunião, o presidente americano e o rei saudita, Salman bin Abdulaziz, elegeram o Irã como o principal país apoiador do terrorismo na região. A ideia era isolar o país dos aiatolás. Nos dias seguintes, a agência de notícias estatal do Catar informou que o governante desse país, o emir Tamim bin Hamad al-Thani, teria criticado o sentimento anti-iraniano na região. O governo disse que a agência teve seu site invadido por hackers, negou todas as afirmações e apagou as notícias. Mas a tensão já estava crescente: no fim de semana, a situação ficou insustentável depois que o emir telefonou para o presidente iraniano, Hassan Rouhani _ algo que foi entendido como um deboche às críticas sauditas. Os países que romperam com o Catar o acusam de apoiar grupos terroristas, o que, de certa forma, é verdade. A questão é que Arábia Saudita, Iêmen e Egito, principalmente, também têm células extremistas em seus territórios.
3) Catar, que país é este?
Com 2,7 miçhões de habitantes, o Catar é um dos países mais ricos e ocidentalizados do Golfo Pérsico. A pequena nação será sede da Copa do Mundo de 2022, é a maior exportadora de gás natural liquefeito do mundo e abriga a rede de TV Al-Jazeera, que ganhou projeção durante a Guerra do Iraque, como uma espécie de CNN do Oriente Médio. Também é sede da Qatar Airways, uma das mais importantes companhias aéreas do planeta. Com capital, Doha, o país abriga o Comando Central (Centcom) americano, responsável por todas as operações das forças armadas dos EUA na região. São 10 mil militares americanos no país – na base aérea de Al-Udeida. Ou seja, o Catar se tornou um enclave estratégico americano, algo que a Arábia Saudita era até anos atrás. Ao mesmo tempo que tem essa relação próxima com os EUA, o Catar sedia a cúpula do grupo extremista Hamas, autoridades do Talibã e financia a Irmandade Muçulmana, grupo político (já foi terrorista) de oposição egípcio.
4) O que muda na sua vida?
Tudo o que acontece no Oriente Médio – e especialmente na região do Golfo Pérsico – mexe com os preços do petróleo e gás natural (ou seja, risco de alta dos combustíveis). Voos foram suspensos (Etihad Airways e Emirates Airline), os espaços aéreos dos seis países árabes foram fechados para aeronaves da Qatar Airways, obrigado a companhia aérea a refaz rotas, operações de transferências bancárias e de comércio exterior também foram suspensas (os bancos egípcios suspenderam negócios com bancos d oCatar).
5) Pode explodir uma guerra?
Há pouca chance. Os EUA são os fiéis da balança – porque é parceiro tanto da Arábia Saudita quanto do Catar. O governo Trump apoiou o isolamento imposto pela Arábia Saudita - que inclusive tem pressionado para os americanos retirem o CentCom de lá. Quem acaba sofrendo diretamente é a população comum. Mais de 90% dos alimentos consumidos no Catar bem de fora – ao fechar a fronteira terrestre, a Arábia Saudita também cerra as portas para esse comércio. No campo diplomático, o Irã (que é islâmico, mas não é árabe, sempre é bom lembrar) sai fortalecido ao ver os rivais árabes se dividirem. A disputa interna também enfraquece a luta contra o Estado Islâmico no Iraque e na Síria.