Separados por oceanos ideológicos, dois mundos se encontrarão na próxima sexta-feira, em Hamburgo, na Alemanha, na reunião de cúpula do G20: o do futuro, regido por uma postura multilateral, que acredita em redes e conexões para que tragédias do século 20 não se repitam; e outro que mantém os dois pés cravados no passado, que busca no isolacionismo e no protecionismo argumentos para gestos populistas para conquistar e manter o poder.
Esqueça a viagem de Donald Trump ao Oriente Médio. Hamburgo será o primeiro grande teste do presidente americano no cenário internacional. Vai ser sua chance de explicar a decisão de virar as costas para os demais países, isolar os EUA e enterrar o Acordo de Paris. Embora sem reuniões oficiais nas agendas, Trump certamente se encontrará com Vladimir Putin nos bastidores.
Os olhos do planeta estarão voltados para os dois líderes das maiores potências em meio a tempos bicudos. Na semana passada, veio a público uma carta assinada por um grupo de influentes ex-ministros, políticos e diplomatas de Rússia, Alemanha, Reino Unido e EUA na qual fazem um apelo por uma declaração conjunta em que se comprometam a jamais começar uma guerra nuclear um contra o outro. “Uma guerra nuclear não pode ser vencida e nunca deve ser travada”, diz o documento assinado pelo ex-ministro de Relações Exteriores da Rússia Igor Ivanov, pelo ex-ministro da Defesa britânico Des Browne, pelo ex-ministro das Relações Exteriores e vice-chanceler da Alemanha Wolfgang Ischinger e pelo ex-senador democrata americano Sam Nunn, responsável por todas as negociações de desarmamento nuclear entre a EUA e União Soviética desde a década de 1980.
O texto sugere também a criação de um novo grupo de contato Otan-Rússia para a gestão de crises, com o objetivo de intensificar as comunicações e reforçar a confiança mútua, reduzindo o risco de acidentes e conflitos desencadeados por erros ou mal-entendidos. As tais pontes.
O risco de confrontos a partir de falhas de interpretação ou fatos isolados nunca foi tão alto desde os mais perigosos anos da Guerra Fria – o ataque sírio com armas químicas e a resposta americana e a crise entre Arábia Saudita e o Irã são exemplos disso. Anfitriã do encontro em Hamburgo, Angela Merkel assumiu as rédeas das discussões para que a cúpula produza mais do que falas vazias. Na quinta-feira, foi ao Bundestag (parlamento alemão) ressaltar que o principal objetivo será conseguir que chefes de Estado demonstrem e admitam responsabilidades em relação às mudanças climáticas.
Uma Europa diferente aparecerá na tradicional foto oficial dos líderes do G20, detentores de três quartos do comércio mundial: fraturada pelo Brexit e atormentada pelo terrorismo. Para costurar acordos, Merkel pode contar com Emmanuel Macron, novo queridinho da Europa. Embora ensaie voos solos, o que já desperta certa rivalidade com a alemã na liderança da União Europeia, o francês ainda é um aliado confiável.
Merkel também espera aproveitar a reunião para estabelecer pontes com potências asiáticas emergentes, como Índia e China. Embora tenha conquistado o apoio da primeira-ministra britânica, Theresa May, para implementar no continente a redução de gases poluentes, a britânica tem outras prioridades: pavimentar a saída do Reino Unido da União Europeia, enquanto tenta garantir sua própria sobrevivência política internamente, depois de quatro atentados extremistas em intervalo de 90 dias e um incêndio na torre que consumiu 79 vidas e boa parte de sua popularidade.