Uma das cidades mais lindas do mundo, entreposto entre Ocidente e Oriente, Istambul, infelizmente, está condenada a sofrer, cada vez mais com atentados como o que, na noite de sábado, matou 44 pessoas e deixou 155 feridas na saída de um estádio de futebol. Primeiro por conta da posição geográfica: a Turquia é vizinha de dois dos países mais perigosos do planeta, Iraque e Síria, convulsionados pelas guerras mais cruéis da atualidade. Por suas fronteiras porosas, não entram apenas milhares de refugiados que fogem dos conflitos carregando na mala o que sobrou de suas vidas. Ingressam também terroristas do cada vez mais capenga – mas ainda com capacidade de ataque – Estado Islâmico. O país é, hoje, a principal rota de extremistas que atacam na própria Turquia ou que seguem para cometer atentados na França e na Bélgica, para ficarmos nos alvos mais recentes do extremismo no continente europeu.
A segunda razão que faz da antiga Constantinopla preferencial para ataques são os problemas políticos internos e as ambições externas do país. Até alguns anos atrás, a Turquia era o bom vizinho da região – principal aliada de Israel na área, parceiro econômico da Síria, membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e com boas relações com a Rússia. Os ventos da Primavera Árabe alimentaram o ego do presidente com pinta de ditador Recep Tayyip Erdogan, que viu na queda, um a um, de presidentes da região, a oportunidade para erigir uma potência local. Aproveitou também a fracassada tentativa de golpe para reafirmar medidas autoritárias, com prisão de milhares de pessoas e censura à imprensa. As ações calaram a oposição, mas não foram suficientes para estancar o terror.
O atentado de sábado foi reivindicado pelo grupo extremista TAK (Falcões da Libertação do Curdistão), organização dissidente do famoso PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão), que luta pela independência da região de maioria curda dentro da Turquia. A ironia é que, no Iraque, os curdos são aliados do Ocidente na guerra contra o Estado Islâmico – na prática, com muito mais sucesso do que o próprio exército iraquiano na luta contra os extremistas. Foram pelo menos 15 atentados na Turquia nos últimos dois anos – até sábado, o maior deles havia deixado 42 mortos e mais de 200 feridos em junho, no Aeroporto Kemal Atatürk, o terceiro mais movimentado da Europa, atrás de Heathrow, em Londres, e do Charles de Gaulle, em Paris.
Istambul, a cidade dos minaretes, onde estão a Mesquita Azul e a Santa Sofia, é ícone da tentativa de integração cada vez mais distante do país à Europa. Desde o 11 de setembro de 2001, sabemos que, quando terroristas atacam uma grande cidade, não estão apenas matando sua população. Estão também aniquilando um símbolo.