Aos poucos, Abu Musab al-Zarqawi passou a se tornar conhecido, em grande parte graças às entrevistas coletivas do então secretário de Estado americano, Colin Powel. A essa altura, seu grupo era responsável por mais de 40% de todas as explosões que ocorriam no Iraque. Também estava cada vez mais evidente o ódio que ele nutria pelos xiitas – facção do Islã que é maioria no Iraque e a quem Al-Zarqawi considerava "a cobra escondida, o escorpião inteligente e malicioso, o inimigo espião e o veneno penetrante", segundo uma carta que teria escrito para Osama bin Laden.
O plano era simples: atacar os xiitas, para incitar a revanche contra os sunitas (minoria no Iraque). Assim, os sunitas, com medo, buscariam proteção nos tentáculos do grupo extremista de Al-Zarqawi.O pupilo era pior do que Bin Laden. Ele tinha um gosto especial por decapitações de inimigos. Vestia os reféns com macacão laranja, como o Estado Islâmico faz hoje em dia, e cortava, pessoalmente, as cabeças dos "infiéis". Nem todos os jihadistas aprovavam a morte de muçulmanos – e esse foi um dos motivos que levaria a Al-Qaeda a romper com Al-Zarqawi anos depois.
Antes disso, em 2004, ele fez juramento de lealdade ao chefe da Al-Qaeda. Al-Zarqawi mudou o nome de seu grupo de Tawhid wal-Jihad para Tanzim Qaedat al-Jihad fi Bilad al-Rafidayn, que significa Al-Qaeda na Terra dos Dois Rios, que os EUA e a mídia ocidental simplificaram para Al-Qaeda no Iraque.
A reação foi imediata. Os EUA atacaram seu feudo, Fallujah, nas mais duras batalhas americanas desde o Vietnã. Muitos viram na batalha de Fallujah a derrota dos jihadistas. Mas o fenômeno foi contrário: os terroristas perderam a cidade, mas ganharam o Iraque, espalharam-se pelo país, chegando até Mossul. Em 2006, a Al-Qaeda no Iraque conseguia arrecadar entre US$ 80 e US$ 200 milhões por ano – em sequestros e pedidos de resgate, roubos de armas americanas e, principalmente, por meio do contrabando de petróleo da refinaria Bayji. A certa altura, o próprio Bin Laden teria pedido dinheiro emprestado a Al-Zarqawi. O discípulo superava o mestre.
No dia 22 de fevereiro de 2006, quatro terroristas se explodiram dentro da Mesquita Al-Askari, em Samarra, um dos lugares mais sagrados do xiismo e local de sepultamento de dois dos 12 imãs reverenciados pela seita. O grupo terrorista de Al-Zarqawi conseguia, finalmente, atrair os xiitas, em grande parte pelas mãos da milícia Exército Mahdi e outros grupos especiais, para a guerra sectária.
Al-Zarqawi foi morto por uma bomba de 250 quilos lançada de um caça F-16 americano no dia 7 de junho de 2006. O sucessor, o egípcio Abu Ayyub al-Masri, que havia viajado ao Afeganistão tempos atrás junto com Al-Zarqawi, tratou de rebatizar o grupo: Estado Islâmico do Iraque. Al-Masri fez parceria com um iraquiano, Abu Omar al-Baghdadi. Ambos estavam decididos a criar um califado, algo que a Al-Qaeda nunca havia pensado. O rompimento com a organização de Bin Laden se daria em maio de 2014. O antigo líder da Al-Qaeda já estava morto, e a cada vez mais enfraquecida rede que havia orquestrado o 11 de Setembro era agora liderada por Ayman Al-Zawahiri.
Na próxima coluna, veja como o Estado Islâmico conquistou, entre a Síria e o Iraque, um território do tamanho da ilha da Grã-Bretanha.