Você viu a coluna anterior como foi o encontro de Osama bin Laden com Abu Musab al-Zarqawi, o homem que fundaria o Estado Islâmico. O Oriente Médio era, nos planos de Al-Zarqawi, a sua própria jihad, uma forma de ganhar asas próprias e voar no firmamento terrorista sem a proteção de Bin Laden.
O Iraque era o território perfeito para isso. Embora não fossem melhores amigos, Al-Zarqawi e Bin Laden tinham em comum o desejo de eliminar toda a presença americana e de seus parceiros – principalmente Israel – do Oriente Médio. Para eles, a ocupação no Iraque era parte de um grande complô judaico-americano para transformar a antiga Mesopotâmia na Grande Israel. Em nome do inimigo maior (o Ocidente), era até necessário se aliar ao Partido Baath e a Saddam Hussein, vistos como "socialistas infiéis". O Iraque havia se tornado o novo Afeganistão, um novo imã magnético capaz de atrair jihadistas do mundo inteiro que deveriam migrar para lá para lutar em nome do Islã e para afastar os cruzados.
Durante décadas a ditadura de Saddam Hussein, de orientação sunita (cerca de 20% do Iraque), mandou e desmandou no país, uma nação cuja população é de maioria xiita (65% da população). O clã Hussein deleitava-se em palácios com banheiros de ouro, enquanto a população vivia em grande parte na miséria. Diante de rebeliões esporádicas, como dos xiitas no Sul ou dos curdos, no Norte, Saddam reagia com armas químicas e massacres.
Em 2003, quando os americanos invadiram o Iraque, o avanço pelo deserto foi um passeio. Em menos de 48 horas, os tanques Abram dos EUA cruzavam as pontes sobre o Rio Tigre, em Bagdá. Não houve resistência aparente. Saddam, por anos, parecia estar mais preocupado com levantes internos do que externos – tanto que, por décadas, erigiu grupos de contrarevolução e divisões pretorianas, como Fedayeen Saddam, para sufocar rebeliões curdas ou xiitas. Eram até 90 mil militares que não moveram um dedo quando os americanos entraram.
Derrubado o regime, instaurada a administração americana, centenas de milhares de militares e ex-oficiais de Saddam perderam o emprego. Houve um processo de "desbaathização" do governo. Os xiitas foram colocados no poder pelos EUA. E o grande problema começou a se erguer no Iraque: a vingança dos sunitas, em grande parte ex-oficiais de Saddam que se jogaram nos braços do jihadismo, entre eles o de Al-Zarqawi e de Bin Laden. Em cidades de maioria sunita, como Fallujah e Ramadi, os extremistas foram recebidos de braços abertos, alimentados pelo sonho de um dia voltar ao poder. A essa altura, Al-Zarqawi tinha um grupo com um novo nome – Tawhid wal-Jihad (Monoteísmo e Guerra Santa) – nome que estava expresso na bandeira do campo que ele comandava em Herat.
Sua estréia no Iraque seria um ataque à embaixada da Jordânia, em Bagdá – Al-Zarqawi tinha preferência por alvos de sua nacionalidade. Mas a grande estréia mesmo seria o ataque com carro-bomba contra a sede da Organização das Nações Unidas (ONU) na capital iraquiana. O veículo explodiu embaixo do gabinete do administrador: Sérgio Vieira de Mello. Não era a toa, como se pensou nas semanas iniciais. O brasileiro morto no ataque era visto como provável sucessor do secretário-geral da ONU Kofi Annan. Fora o grande construtor do Timor Leste – território cristão, que havia obtido a independência da Indonésia, o maior pais muçulmano do mundo.
O Brasil começava a sentir os efeitos do terrorismo. E o Iraque estava cheio de extremistas que haviam atendido ao chamamento de Bin Laden. Quer saber mais? Na próxima coluna!