O massacre de Nice é o quinto grande atentado na Europa – e o terceiro na França – em apenas um ano e meio. Militarismo nas ruas e reforço nas fronteiras e nos aeroportos passaram a fazer parte do cenário no continente. Mas como evitar que um caminhão seja jogado contra uma multidão? Nada parece ser suficiente, e a União Europeia, por isso, está atônita. O horror atingiu muito mais do que os dois quilômetros da Promenade des Anglais. Veja o impacto...
... na política francesa
De todos os países europeus, a França é o que mais tem sofrido com o terrorismo – Charlie Hebdo, Bataclan e, agora, Nice. É também o que mais tem se envolvido no combate ao terrorismo dentro e fora de seu território – na Síria e no Iraque, contra o Estado Islâmico (EI). Em 2014, o EI difundiu uma cartilha conclamando franceses de origem muçulmana a atentar contra cidadãos... franceses, fazendo uso de qualquer "arma" a sua disposição: de facas a caminhões. Ganham ainda mais força os partidos de direita: Marine Le Pen, da Frente Nacional, disse que "a guerra ao terror não começou de fato". Alain Juppe, ex-primeiro-ministro conservador, fala em falhas no dispositivo antiterrorista. O terror encontra um país fracionado pelo populismo de direita em ascensão, por conflitos trabalhistas e pelo eterno dilema entre os valores republicanos e laicos e a falta de integração da minoria muçulmana.
... na segurança
A França é um país com um aparato de segurança vigoroso e está sob estado de emergência desde novembro, que será prorrogado. Após os ataques de novembro, cerca de 10 mil militares foram deslocados para vigiar centros religiosos, colégios, estações de trem e aeroportos. Não foi suficiente. Há impotência e perplexidade. Não há como garantir 100% de segurança – muito menos em casos de ataques dos chamados lobos solitários. A presença de militares com fuzis e coletes à prova de balas é parte da paisagem do país. Governo e parlamento aprovaram pacotes de leis antiterroristas, que colocam o cidadão comum sob a mira da espionagem eletrônica. Mas o país não tem agentes suficientes para monitorar sequer os cerca de 10 mil "radicalizados".
... no turismo
O terror atinge em cheio o turismo, responsável por 7% do PIB do país. Depois da famosa casa de teatro Bataclan, do Stade de France, é a vez da Nice dos hotéis luxuosos, das mansões, dos iates e de sua costa azul mediterrânea. A repetição de atentados pode desestimular turistas por um bom tempo.
... na guerra ao EI
A França deve aumentar as ações de sua aviação na Síria e no Iraque, bastiões do Estado Islâmico.
... na xenofobia
Nos últimos anos, tem havido enorme aumento de atos contra muçulmanos na França. Os ataques reforçam o discurso contra o Islã e a imigração vinda do Oriente Médio e do norte da África. O tamanho da população estrangeira na Europa é de apenas 4%, segundo a Eurostat, agência estatística da UE. É importante lembrar que a guerra dos terroristas não é só contra o Ocidente, mas também contra muçulmanos tidos como "infiéis". No total de ataques terroristas no mundo, há mais vítimas muçulmanas do que de outras crenças – um exemplo é o atentado em Bagdá, que matou 250 pessoas há duas semanas – embora nem sempre chamem tanto atenção quanto os que ocorrem na Europa.
... na União Europeia
O ataque é um golpe contra a França, mas também a todo o continente. A UE está em meio a uma crise de identidade com a saída do Reino Unido e enfrenta o terror em seu estado puro. Esses ataques golpeiam o estilo de vida do Ocidente e seus valores. A luta antiterrorista foi acrescentada à agenda de discussões dos 28 ministros das Relações Exteriores do bloco, na segunda-feira, em Bruxelas. Após grandes ataques a Bruxelas e Paris, ocorreram as mesmas reuniões de emergência. Nada resultou de concreto.
... na livre circulação
O terrorismo põe em xeque o estilo europeu de bem viver, da garantia do estado laico, dos valores humanistas e de livre circulação. Ganha força o discurso de fechar fronteiras e suspender temporariamente garantias de privacidade.
... na eleição americana
Nos EUA, a exploração do medo é parte do jogo político há décadas. Mas Donald Trump faz uso perfeito dessa artimanha eleitoreira, ao demonizar estrangeiros – em especial muçulmanos –, principalmente depois das chacinas de San Bernardino e da boate gay de Orlando. Ganha adeptos sua ideia de construir um muro entre o México e os EUA, sem falar na proposta de deportar ilegais. Hillary despencou nas últimas semanas nas pesquisas, Trump está mais vivo do que nunca.