* Economista
Hoje queria escrever um pouco, leitora, sobre um tema inusitado nesta coluna: você! Sim, você mesma que possa estar me lendo neste momento. Em outras palavras, a mulher. O que seríamos sem você? Da mulher, pode-se dizer – e com mais razão – o que Nietzsche dizia da música: sem ela, a vida seria um erro, um cansaço, um exílio.
Nietzsche, um misógino por excelência, jamais concordaria com esse uso da sua bela declaração de amor à música. Mas, vá lá: hoje em dia qualquer um enfia, sem a menor cerimônia, os piores "cacos" no meio da obra dos maiores gênios. E, convenhamos, a declaração de amor à mulher não é nenhum "caco". É mais do que merecida. Afinal, o sabor, a graça, a beleza, a leveza, o ritmo, a intensidade, a variedade das nossas vidas dependem de você, leitora.
Ultimamente, as mulheres parecem não mais aceitar esse papel vital (da boca para fora, pelo menos). Não querem ser decorativas. A beleza não é o mais importante, dizem. Querem ser bem-sucedidas, respeitadas profissionalmente e contribuir para o progresso social e econômico. Tudo bem, tudo bem. Mas, convenhamos, ser bonita, charmosa e elegante também é serviço público! Sempre foi. Não vamos diminuir a já reduzida alegria no mundo impedindo, por meio de restrições e preconceitos, que a mulher impeça a vida de ser um erro, um cansaço, um exílio.
A leitora conhece François Truffaut? Um dos seus filmes, "O homem que amava as mulheres", conta a história de um homem fascinado pelas mulheres. Fala, portanto, de todos os homens. Em determinado momento, o personagem resolve escrever um livro sobre suas memórias amorosas e nele inclui uma descrição deslumbrante da irrupção das mulheres com a chegada da primavera: "Como certos animais, as mulheres praticam a hibernação. Durante quatro meses, elas desaparecem, e ninguém as vê. Com os primeiros raios de sol do mês de março, como elas tivessem combinado ou como se tivessem recebido uma ordem de mobilização, elas surgem às dezenas nas ruas em vestidos leves e salto alto. Então, a vida recomeça".
Perfeito. Truffaut foi um grande artista e seus filmes merecem ser vistos e revistos.
Paro um momento e releio o que escrevi. Corrijo aqui e ali. Ficou bem, creio, mas vejo que estou resvalando para a celebração da mulher no plural. A verdade é que a mulher sonha ser amada e celebrada no singular, como única, como grande e único amor. E o homem que perde isso de vista está fadado a morrer na mais triste e completa solidão.
Repare, leitora, neste pequeno verso de Fernando Pessoa: "O amor, quando se revela,/ Não se sabe revelar/ Sabe bem olhar p'ra ela / Mas não lhe sabe falar/ Quem quer dizer o que sente/ Não sabe o que há de dizer/ Fala: parece que mente/ Cala: parece esquecer."
Linda simplicidade do poema! Pessoa começa no plano geral, enunciando uma tese: "O amor, quando se revela, não se sabe revelar", mas – e aí vem o interessante – afunila imediatamente no particular : "sabe bem olhar p'ra ela". Ela – não a mulher em geral, não as mulheres no plural, mas uma mulher em particular, aquela que podemos designar por essa pequena palavra – ela – tão rica em conotações afetivas e amorosas.