Texto publicado em Zero Hora no espaço de David Coimbra, que está em licença médica.
Escrevi esses tempos que dinheiro não compra ninguém. O dinheiro até pode atrair meia dúzia de aliados por algum tempo – mas jamais serão aliados confiáveis, porque bastará o dinheiro acabar para todos pularem fora. O que realmente compra as pessoas, o que faz delas eternamente leais e gratas, o que faz delas soldados incapazes de abandonar um companheiro é outra coisa.
No capítulo 13 da famosa Carta aos Coríntios, Paulo de Tarso explica que coisa é essa. Ele diz o seguinte: "E ainda que eu tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria".
Quer dizer: não adianta ter poder, nem inteligência, nem toda a cultura do mundo, não adianta acreditar em Deus nem encontrar as respostas que a humanidade procura se, no fim das contas, não houver afeto. Sem amor, é o que Paulo prega, um homem não é nada. A vida se torna vazia – e não há quem queira lhe ser leal.
Se você dá afeto, se presta atenção no outro, se sorri para as pessoas e tenta ajudá-las, aí a dívida de gratidão se torna eterna. Foi nisso que pensei quando um estudante de jornalismo, semanas atrás, me perguntou que conselho eu lhe daria na profissão.
– Talento é o de menos – foi o que eu disse. – Em qualquer profissão, talento é secundário.
Reconheço que exagerei – talento é importante, óbvio. Mas queria deixar claro que o talento é apenas um entre tantos pilares de um bom profissional. Outro pilar é a persistência – ou saber engolir sapos. Se o sujeito é incapaz de lidar com frustrações e fracassos, não admite bronca de chefe, já começa a carreira só querendo fazer "o que gosta", aí seu fabuloso talento não servirá de nada.
Mas não há pilar mais importante do que o do afeto. Conheço profissionais talentosíssimos, das mais diversas áreas, que, por serem intratáveis ou geniosos demais, não conseguiram decolar. Por quê? Porque ninguém chega a lugar algum sem aliados. Ninguém decola sem pessoas que o ajudem a decolar.
As pessoas se sentem em dívida, não querem abandoná-lo, estão presas à teia de afeto que ele foi tecendo ao longo dos anos.
Vale o mesmo para veteranos: eles duram mais em seus cargos e têm mais tempo de sucesso quando são afetuosos. Conheço o chefe de uma faculdade, por exemplo, que há anos sabota o próprio trabalho por conta do alcoolismo, mas durante décadas ele foi tão generoso com os colegas que ninguém tem coragem de demiti-lo.
Alguém dirá que o correto seria, sim, mandá-lo embora, e talvez eu concorde, só que esse homem comprou as pessoas – e não foi com dinheiro: elas se sentem em dívida, não querem abandoná-lo, estão presas à teia de afeto que ele foi tecendo ao longo dos anos. E, como constatou Paulo na Carta aos Coríntios, o amor "tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta".
Quer dizer: as pessoas toleram o pior quando existe amor. Porque só ele pode fazê-las eternamente gratas, só ele consegue preenchê-las de verdade. Não haverá quantia alguma de dinheiro que um dia possa alcançar tamanho poder.