Volto de férias com a notícia de que 250 quilos de lixo foram retirados, nos últimos dias, do espelho d'água do Largo dos Açorianos. Não chega a ser uma surpresa – o porto-alegrense dá vexame sempre que o assunto é esse –, mas vale a reflexão: se nem um dos espaços públicos mais espetaculares da cidade é digno do nosso cuidado, o que poderia ser?
Talvez não exista em Porto Alegre outro local que reúna, a céu aberto, história e beleza com tanta força. A Capital literalmente cresceu em volta da Ponte de Pedra, que depois virou um monumento à memória da cidade – e se tornou a cara daqui, inspirando pintores e fotógrafos por mais de século.
Há cinco meses, o Largo dos Açorianos renovou sua importância. Reaberto após três anos em obras, agora com jatos ornamentais, arquibancadas e até uma cascata, o espaço passou a receber diariamente centenas de pessoas que buscam um sopro de paz em meio à agitação do Centro Histórico. Aquilo é um oásis no caos urbano.
Por que maltratamos um local que nos orgulha?
É um problema clássico de países subdesenvolvidos: o espaço público, na cabeça das pessoas, não é um lugar que pertence a todos – inclusive a elas mesmas. É um lugar que não pertence a ninguém.
Alguns dizem que faltam lixeiras no Açorianos. Até pode ser, mas, se o cidadão consegue trazer o lixo, supõe-se que também consiga levar. Só que, como o espaço "não é de ninguém", o problema não é dele – embora seja ele quem desfrute da área. Experimente botar a mesma pessoa em um shopping. Ainda que faltem lixeiras, ela terá vergonha de jogar papel no chão, porque aquele é um ambiente privado: sabe-se que pertence a "alguém".
No Largo dos Açorianos, o espelho d'água é tão imundo que, para remover a sujeira do fundo, na semana que vem, funcionários precisarão vestir um macacão especial para fazer o mergulho. E nenhum esgoto desemboca ali – a água é contaminada por causa do lixo que o povo joga.
Contratada pela OAB, que adotou o largo em dezembro, a empresa responsável pela limpeza encontrou de tudo no laguinho: de garrafas a perucas, passando até por um vibrador.
– Era de silicone e cor de rosa, igual ao órgão sexual masculino. Eu já tinha encontrado dentadura, mas isso foi a primeira vez – conta o diretor da Athena, Raphael Gonçalves.
A falta de educação é mesmo obscena.