Em resposta ao texto que publiquei nesta terça-feira (30), criticando o projeto que prevê a construção de duas torres junto ao Beira-Rio, o vice-presidente de Assuntos Estratégicos do Inter, João Pedro Lamana Paiva, me enviou uma nota educada.
Ele lembra que, embora a área do estádio tenha sido doada pelo município, o espaço era "um terreno que não existia". Ou seja, só havia água. De fato, foi o clube que aterrou a região para erguer o Beira-Rio sobre o Guaíba. Diz Lamana Paiva: "A lei de doação foi clara ao determinar que quem pagaria todos os custos do aterro seria a entidade donatária (Internacional), sem ônus para o município".
O vice-presidente ainda ressalta que, em 1988, a lei municipal 6.150 alterou a legislação de 1956, que havia oficializado a doação da área "para construção de uma praça de esportes". Segundo a nova lei, o Inter – atenção para este trecho – não poderia utilizar o terreno "para outro fim, ressalvada a implantação de equipamentos e comércio de apoio ao fortalecimento de recursos financeiros para a entidade esportiva".
Portanto, como os prédios ajudariam nesse "fortalecimento de recursos financeiros", a construção estaria amparada na lei. Respeito, claro, o ponto de vista de Lamana Paiva – ele honestamente acredita, não tenho dúvida, que as edificações trariam benefícios não só para o Inter, mas para Porto Alegre. Há dois aspectos, no entanto, que preciso sublinhar:
1) O fato de ter aterrado uma área que um dia foi pública, na orla do Guaíba, não dá a ninguém o direito de romper um acordo. Aliás, o Inter só foi autorizado a aterrar aquela região porque topou, há 63 anos, usar o espaço exclusivamente para construir seu parque esportivo.
2) Lojas que vendem uniformes, museu, estacionamento, bares e restaurantes, tudo isso certamente são "equipamentos e comércio de apoio" para uma praça de esportes, conforme a lei prevê. Mas um hotel de 130 metros de altura? Um espigão com residências e escritórios? Para mim, são só desvio de finalidade.
Ainda assim, o debate que Lamana Paiva propõe é legítimo – e deverá ser aprofundado na Câmara de Vereadores, que fará inclusive audiências públicas para discutir as torres do Beira-Rio. Repito, não tenho nada contra essas construções imensas em grandes centros urbanos. Desde que o investidor, claro, tenha comprado a área onde pretende investir.
Leia a íntegra da nota do vice-presidente de Assuntos Estratégicos do Inter:
Prezado jornalista Paulo Germano,
Ao saudá-lo e em atenção ao artigo publicado em Zero Hora com o título "Espigões do privilégio", tomo a liberdade de encaminhar comentário sobre a origem da aquisição do imóvel objeto do Beira-Rio pelo SCI.
Agradeço a gentileza e cumprimento pelo trabalho.
ORIGEM (completa)
Em 9 de outubro de 1956, a Lei Municipal n.º 1.651 autorizou a doação ao Sport Club Internacional de um espaço dentro do Rio Guaíba. Efetivamente o que o Estado doou foi um terreno que não existia, sendo "uma área a ser conquistada ao Rio Guaíba, dentro do plano de aterro da futura Avenida Beira Rio" para implantação de "uma praça de esportes", futuro Complexo Beira-Rio.
A lei de doação foi clara ao determinar que quem pagaria todos os custos do aterro seria entidade donatária (Internacional), sem ônus para o Município. Também ficou o clube obrigado a realizar o aterro no prazo máximo de dois anos.
Posteriormente, a Lei Municipal nº 6.150, de 12 de julho de 1988, deu nova redação à Lei nº 1.651/56, determinando que a entidade esportiva não poderia utilizar a área "para outro fim,ressalvada a implantação de equipamentos e comércio de apoio ao fortalecimento de recursos financeiros para a entidade esportiva".
O imóvel do Beira-Rio possuí uma área de 150.361,63m² a qual encontra-se matriculada sob o nº 6.258 – Livro 2 Registro Geral do Registro de Imóveis da 5ª Zona de Porto Alegre.
João Pedro Lamana Paiva
Vice-presidente de Assuntos Estratégicos do Sport Club Internacional