Prefeito de Bogotá, Enrique Peñalosa transformou sua cidade em modelo internacional de mobilidade urbana com ideias, digamos, diferentonas. Ele entende, por exemplo, que o estacionamento de carros em vias públicas não é um direito adquirido – e que ninguém pode cobrar da prefeitura essa regalia.
Por que poderia? Se o cidadão compra uma geladeira e não tem onde guardá-la, o problema é dele – não pode achar que o poder público tem a obrigação de resolver uma dificuldade que ele criou para si próprio. Com os automóveis, não há por que ser diferente. Quem quiser tê-los, que encare o preço de um estacionamento privado ou deixe-os em casa para usar o transporte coletivo, como fazem milhões de pessoas todo dia.
Ao impedir que se estacione na rua, segundo Peñalosa, é possível aumentar em 40% a fluidez do trânsito sem gastar um centavo em obras de duplicação. O dinheiro, portanto, pode ser investido em um transporte público que atenda a todos com eficiência e conforto.
Aqui se faz o contrário. Além dos carros, as vias recebem todo tipo de cacareco, inclusive caçambas guardando entulho de reformas particulares e qualquer inutilidade que esteja atrapalhando. Quer dizer: a rua não é um espaço que pertence a todos, é um espaço que não pertence a ninguém.
Peñalosa inverte essa lógica ao afirmar que, se um ônibus leva 45 pessoas enquanto um carro leva só uma, o primeiro merece ocupar 45 vezes mais espaço na via pública. É a busca incansável pelo célebre bordão de autoria desconhecida: "Cidade desenvolvida não é onde pobre anda de carro, mas onde rico anda de ônibus".
Pode-se discordar de tudo isso, mas são ideias. Não do prefeito de Berlim, de Paris ou de Nova York – são do prefeito de uma capital com realidade socioeconômica nem tão distante da nossa. Em Porto Alegre, há quase dois meses, Nelson Marchezan trouxe de Juiz de Fora (MG) um secretário extraordinário de Mobilidade Urbana: Rodrigo Mata Tortoriello, consultor especializado em transporte público. Currículo ele tem. Será que tem boas ideias?
A falência do transporte coletivo pode ser irrelevante para quem mora nos bairros centrais, mas e para quem vive na periferia?
O que fazer, por exemplo, para frear a evasão em massa do transporte coletivo? Cada vez mais gente deixa de andar de ônibus para andar de Uber. Com menos passageiros e, portanto, menos receita, as concessionárias aumentam o valor da passagem – o que faz mais gente deixar de andar de ônibus para andar de Uber, e assim por diante.
A falência do sistema pode ser irrelevante para quem vive nos bairros centrais, mas e para quem mora na periferia? Uma corrida de aplicativo da Restinga ao Centro custa R$ 40. O grosso dos trabalhadores sempre vai precisar do transporte coletivo – e, em mobilidade urbana, para ganhar de um lado, é preciso perder de outro. No caso de Peñalosa, perderam os carros com as restrições de estacionamento na rua.
Não é fácil, claro. Ainda mais em Porto Alegre, cidade com histórico de aversão a novidades: muito mais difícil do que ter boas ideias é botá-las em prática. Mas não dá para ficar assistindo ao velório sem fazer nada. Sorte – e coragem – ao novo secretário.