A Eurocopa 2016 começa sob o temor da ameaça terrorista na França, mas também tentando apaziguar a polêmica surgida no país em torno de denúncias de racismo na seleção nacional.
A controvérsia foi deflagrada pelo ex-jogador Eric Cantona, ao acusar o treinador da equipe francesa, Didier Deschamps, de discriminação racial por não ter convocado Karim Benzema e Ben Arfa por causa das origens magrebinas dos dois jogadores.
– Ele, Deschamps, tem um nome muito francês. Aliás, talvez seja o único em nosso país a ter um verdadeiro nome francês. Ninguém, na sua família, se misturou com qualquer outro. Como os mórmons nos Estados Unidos. (…) Os dois (Benzema e Ben Arfa) têm origens norte-africanas. Portanto, o debate está aberto – anunciou Cantona.
O próprio Benzema – oficialmente afastado da seleção por envolvimento na Justiça em um caso de sextape – não deixou a bola quicando: deu de bico afirmando que sua ausência na equipe se deve a Deschamps ter cedido "à pressão de uma parte racista da França". O franco-marroquino Jamel Debouzze, célebre humorista na França, colocou lenha na fogueira ao criticar a convocação por não ter nenhum de "nossos representantes" no time.
Na Copa de 1998, o líder da extrema-direita francesa Jean-Marie Le Pen alertara sobre as origens de certos jogadores da seleção campeã do mundo, entre eles o craque Zinedine Zidane, carrasco do Brasil na final, por ter um pé na Kabyle, região de uma minoria argelina, e crescido num bairro árabe da cidade de Marselha.
– É uma vergonha, muitos deles não sabem nem cantar direito o hino da França – disparou na época o mandarim direitista.
Quando entrevistei o técnico campeão do mundo Aimé Jacquet, a bola foi para o outro lado:
– A vitória da França foi uma grande osmose. Não houve preocupação porque havia brancos, negros, pessoas de diferentes cores ou religiões. Foi a França da multiplicidade racial que venceu.
"O futebol e a pátria estão sempre ligados", escreveu Eduardo Galeano em Futebol ao sol e à sombra, e é o que ao mesmo tempo "inflama" os jogadores da seleção francesa e "gangrena" a França, avaliou uma analista política.
Espera-se ao menos que, até o apito final, a Eurocopa se encerre sem bombas terroristas.
MUSAS
Artista plástica, a francesa Aude Herlédan nunca deixou de pintar e de viajar pelo mundo – na juventude, viveu seis meses em Manaus, no Brasil. Mas foi no final do ano passado que decidiu abandonar o emprego na publicidade para assumir plenamente sua criação artística independente. Mais do que isso, criou a sua própria galeria de arte, batizada de 1831, instalada no número 6 da Rue de Lille – bem em frente ao número 5, onde o psicanalista Jacques Lacan atendeu seus pacientes de 1940 até 1981, data de sua morte.
A atual mostra, intitulada Musas, uma interpretação em torno do tema da mulher, reúne sete originais artistas, da street art à pintura, passando pela fotografia: Isabelle Boccon-Gibod, Kashink, Amel Bashier, Joséphine Kaiser, Ute Faber, Marc Guéret e a própria galerista (com a bela série de telas em tonalidade amarela, abaixo). O fotógrafo Marc Guéret, que considera o retrato inseparável da reportagem, foi o único homem convidado, apresentando uma imagem feminina, numa homenagem-denúncia (acima), que se poderia confundir com uma pintura.