Acompanhei no último domingo (5) a live cheia de ternura de Jorge Drexler, transmitida de Madri, com recados significativos para os brasileiros, para seus patrícios uruguaios e para sua imensa legião de fãs sul-americanos, entre os quais me incluo desde que ouvi pela primeira vez La Edad del Cielo. Conheci a música de Drexler por sugestão da querida amiga Fernanda Zaffari, que hoje encanta os londrinos com seu multitalento de jornalista e mãe do Rocco e da Lola. Mais do que cantor – advertiu-me a colega –, ele é um poeta.
Agora pude constatar que, mais do que um poeta, ele é um sujeito simpático e solidário. Foi emocionante ver, por exemplo, a forma carinhosa com a qual Drexler tratou os componentes da equipe que o apoiou no seu show solitário. Para cada um dos 18 técnicos e produtores, dedicou agradecimentos elogiosos, seguidos de abraços compatíveis com o atual protocolo de distanciamento social. A convalescênça da covid-19, que contraiu na Espanha na fase mais aguda da pandemia, parece tê-lo deixado ainda mais sensível.
Até mesmo na mensagem aos brasileiros foi delicado, apesar do teor levemente crítico: “Cuidem-se, independentemente da visão oficial”, disse. O médico Drexler também fez questão de homenagear e enaltecer a ciência, lembrando que ela deve ser colocada acima da política, especialmente num momento angustiante como o que a humanidade está vivendo.
Aliás, a ciência foi representada no espetáculo por uma alegoria inteligente e divertida. Antes de interpretar Abracadabra, Drexler colocou em funcionamento um Pêndulo de Newton, dispositivo formado por bolinhas de metal que se entrechocam continuamente depois de um pequeno impulso, demonstrando na prática a teoria da transmissão e da conservação de energia. O pêndulo marcou o ritmo da canção e serviu de gancho para uma fala sobre Galileu Galilei e Lavoiser, este último inspiração para a letra de Todo se Transforma.
A arte, a inteligência e a sensibilidade de Drexler transformaram o domingo de pandemia num dia mais agradável para todos os que se deixaram embalar pela poesia de suas canções.