Seria encarado com normalidade que um atacante veterano, rico e com muitas dores a acompanhá-lo carreira afora anunciasse o fim da passagem pela seleção do seu país sem nenhuma expressão de tristeza e sim de alívio.
Nunca mais levar pancada no joelho, choque de cabeça, carrinho homicida, só carregar dali para diante os louros de um trabalho bem-sucedido e o justo conforto proporcionado pelo dinheiro ganho merecidamente.
Luis Suárez foi na mão oposta ao anunciar o encerramento do seu ciclo na Celeste. Estava emocionado antes mesmo da primeira fala. Ao construir a frase letra a letra onde confirmaria o fim, demorava como se não encontrasse as palavras ou não as quisesse encontrar.
Sou franco admirador de todo profissional, em qualquer área de atividade, que mantém a paixão pelo que faz tão flamante como da primeira vez em que sonhou ser o que se tornou.
Luisito, que eu já tinha em alta conta pela qualidade do seu jogo e trajetória de redenção que teve depois de surtar a mordidas contra zagueiros adversários, ganhou mais pontos ao chorar pelo fim que se aproxima.
É um desafio e tanto, combinemos, manter acesa a chama desta maneira. Imagine a quantidade de vezes em que Suárez jogou machucado ou com muitas dores.
As vezes em que, por problemas pessoais, queria estar em qualquer outro lugar, menos no campo, e ainda assim foi protagonista e ajudou seu time a vencer.
Na infinita quantidade de quartos de hotel, geralmente cinco estrelas, é verdade, mas ainda assim impessoais e tendo ao lado não sua mulher ou filhos e sim um companheiro de elenco. Ou na milhagem de quem andou por todos os continentes correndo atrás da bola. Sobrariam razões para que um jogador, ao perceber que não dá mais, só sentisse alívio pelo fim do estresse.
Quando Suárez estava na frente daquele microfone em que anunciou o encerramento na seleção uruguaia, nada de ruim na carreira estava em sua mente, só as delícias de ser o que é, de ter sido o que quis ser desde menino.
Vai jogar mais algum tempo com o amigo Messi no futebol norte-americano, depois passaria por outra espécie de morte em vida, que será o fim definitivo da carreira.
Paulo Roberto Falcão, um dos maiores meio-campistas de todos os tempos, cunhou a frase de que jogador de futebol morre duas vezes. A primeira, quando pendura as chuteiras. A sentença poderia ser ampliada para outros esportes, basta ver o quanto custou para Michael Jordan parar de jogar basquete. Mas é o futebol que traz as histórias mais doloridas.
Se existem Falcão e Júnior a mostrar que existe vida depois dos gramados, outros tantos e não menos famosos perdem-se nas esquinas da vida.
Suárez tem planos para o depois, já comprou clube no Uruguai, talvez invista em futebol nos Estados Unidos, mas é o primeiro a saber que nada vai se comparar à emoção do gol feito a golpes de talento ou valentia, a bola na rede que transforma a voz humana em urro e faz parecer, naquela hora, que não existe nada mais importante na face da Terra.