Alessandro Barcellos não teria como segurar o técnico de sua convicção com o combo de maus resultados e desempenhos do mesmo nível em pouco mais de três meses de trabalho presencial. Sim, porque Ramírez estava trabalhando de longe em janeiro e fevereiro, quando certamente viu todos os jogos e treinos do Inter sob Abel Braga e pôde constatar do que seria capaz aquele grupo de jogadores.
Então, quando se fala do trabalho do técnico do espanhol, não se contabiliza só o período de treinamentos mas também as observações anteriores. A performance do treinador era ruim. Não se tratava só de não ser boa. Se os jogadores não compreendem o que ele quer, cabe ao comandante reduzir a marcha de sua revolução para proteger o próprio andamento do processo.
Ramírez volta e meia fazia parecer que o resultado era o último fator que lhe interessava. Futebol nunca será assim em clubes de torcida e tradição. Não pode medir trabalho só por resultado, mas não pode também desprezá-lo, ainda mais quando a performance coletiva não avançava jogo a jogo. Ficou insustentável para a nova gestão manter seus planos. Então, o que fazer?
Estabilizar.
O novo presidente veio cheio de planos, direito seu e até obrigação. Porém, a prática não correspondeu às intenções. E aqui escreve um ferrenho defensor da manutenção do trabalho proposto, já que se firmou uma convicção no nome do profissional que viria realizá-lo. No entanto, defender trabalhos longos não me tira a visão do todo. Não posso desconsiderar o quanto ficou inviável a permanência de Ramírez e, mais do que isso, entender que a solução encontrada foi a melhor para o revés enfrentado. Não havia evolução.
Houve estagnação e até involução recente no que se pretendia fazer por parte do comandante. O Inter tem um ponto em seis no Brasileirão enfrentando times médios do Brasil. Foi eliminado de forma vexatória por um time de Série B e empatou em 0 a 0 com os bolivianos do Always Ready na Libertadores. Se fossem só os resultados, eu não seguiria no raciocínio. Mas não são só os placares. O trabalho não era bom. Não avançava em nenhuma direção. Escaldado por Cruzeiro, Vasco e Botafogo na segunda divisão brasileira, o presidente decidiu agir e não lhe tiro a razão. Então, o que fazer?
Estabilizar.
Não é hora de revolução. O Inter precisa parar de perder ponto para quem lhe é inferior e tornar mais seguro seu caminho de curto e médio prazo. Significa que apostar em Maurício Barbieri, por exemplo, seria tão arriscado agora como manter Ramírez. Neste sentido, Lisca ou mesmo Dunga fazem mais sentido para o contexto colorado. A hora é de travessia por um mar crespo demais para uma nova tacada de risco.
Em junho de 2021, duas rodadas de Brasileirão, o Inter só tem esta competição e a Libertadores por disputar. Com poucos recursos para investir em time competitivo para ser campeão. Então, o pragmatismo se impõe para evitar o pior, que seria correr risco de rebaixamento no primeiro ano da nova gestão, que tantos bons projetos tinha e tem para o clube. Paulinho da Viola cantou em Argumento: faça como o velho marinheiro, que durante o nevoeiro leva o barco devagar. Simples assim. Pandemia, pouco dinheiro, zero torcida no estádio e um estado geral de exceção obrigam pessoas, empresas e clubes a comportamentos parecidos. Cautela. Prudência. Menos é mais.
Neste fim de semana, completo 57 anos de idade. Cabelos brancos dominando a cabeça que mantém intactos sonhos e cores, mas que aprendeu com pancadas da vida a diminuir o passo quando a neblina turva o olhar à frente. Já aconteceu na minha vida, acontecerá outras tantas na minha e na de todo mundo, está acontecendo, guardadas as proporções da comparação, com o Inter nesta hora.
A nova direção queria ser protagonista, impactante e revolucionária. Elegeu-se sob este mantra e, combinemos, é legítimo que quisesse tudo isso logo de saída. Porém, ah, porém, a realidade deu um carrinho voador nos dois joelhos do sonho de Alessandro Barcellos. É caso de repensar, revisar, estabilizar para só depois avançar. Machucada por poucos títulos recentes em relação ao grande rival, a torcida do Inter não merece correr o risco de sofrer de angústias sofridas cinco anos atrás, como medo de cair, ou o constrangimento de quatro anos atrás, de jogar a Série B. A realidade do gigante que cai mudou. O dinheiro não sobra mais, o escudo pesa menos. O choque de realidade a que se propõe, a contragosto, a direção colorada é questão de sobrevivência.
Como Barcellos disse meses atrás, o Inter precisava vender jogador para pagar água e luz. Agora, precisou romper com a ruptura para reduzir os danos.