O dia seguinte ao primeiro turno das eleições na Argentina é de cautela entre o presidente Lula e seu entorno. O desempenho acima do projetado em pesquisas de Sergio Massa, o candidato preferido do Planalto, provocou reações tímidas, especialmente porque o segundo turno é imprevisível. Lula ainda não comentou o resultado publicamente e alguns de seus ministros fizeram postagens breves em redes sociais.
Atacado pessoalmente por Javier Milei, Lula tem evitado responder às provocações e orientou sua equipe a manter o foco na preservação da histórica relação comercial entre os dois países. O empenho de parlamentares ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que inclusive foram à Argentina apoiar o candidato de extrema direita, não foi visto na mesma proporção entre representantes da esquerda.
Mas o alinhamento entre o mandatário brasileiro e o governo peronista é evidente. Lula fez questão de priorizar o país vizinho como primeiro destino de sua extensa agenda internacional no terceiro mandato, o que também foi um gesto de agradecimento ao apoio que recebeu do presidente Alberto Fernández quando estava preso. Mas as demonstrações de apoio efetivo do governo brasileiro até agora ficaram muito aquém do que Fernández, Massa e seus aliados esperavam.
A postura é de certa forma esperada. Além de a América do Sul estar muito distante do período de recuperação e otimismo que Lula e os Kirchner compartilharam há 20 anos, o presidente brasileiro tem uma série de problemas internos a resolver no curto prazo - inclusive para viabilizar seu terceiro mandato.
Nos últimos anos, a Argentina perdeu espaço no mapa das relações comerciais do Brasil, mas é inegavelmente um forte parceiro. Mesmo em crise, trata-se de um mercado indispensável para o desenvolvimento da indústria - com peso importante para empreendimentos no Rio Grande do Sul. Também é relevante na ideia de fortalecimento do Mercosul e do futuro acordo com a União Europeia.
Por isso, ainda que esteja desgastado internamente e seja protagonista de uma política econômica que levou o país à hiperinflação, com empobrecimento e várias consequências sociais, Massa representa ao governo brasileiro uma garantia de continuidade de uma parceria estratégica.
No caso de Milei, além da oposição no campo ideológico, o governo teme o enfraquecimento da união regional - o que pode prejudicar as negociações do Mercosul com a União Europeia. Eventuais barreiras à relação comercial partindo da Argentina não estão descartadas, mas é preciso levar em conta de que neste momento isso acarretaria mais prejuízos ao país vizinho do que ao Brasil.