A discussão sobre os limites para novas demarcações de terras indígenas não termina na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que nesta quinta-feira (21) alcançou maioria contra a tese do marco temporal. Inconformados com o posicionamento da Corte, parlamentares que defendem limite na disputa de terra pelos povos originários querem regulamentar o tema em projeto de lei (PL) já aprovado na Câmara e que tramita no Senado nesta quinta-feira (21).
Na prática, os ministros do STF entenderam que os povos originários podem reivindicar qualquer área já ocupada por eles, sem a data-limite relacionada à promulgação da Constituição de 1988.
Por vários motivos, é errado afirmar que a decisão promoverá a imediata expulsão de produtores rurais de suas propriedades para que indígenas sejam abrigados. É fato, contudo, que o julgamento facilitará o processo de reivindicação de novas áreas e poderá beneficiar os indígenas em disputas já em andamento.
O julgamento tem repercussão geral, ou seja, a decisão embasará os demais casos semelhantes do país. Segundo o STF, 226 processos de demarcação podem ser impactados.
Mas os casos de demarcação ainda exigirão análise individual, em um processo demorado e complexo que ao final depende de aval da Presidência da República. Além das discussões sobre direito de propriedade, o governo costuma levar em conta o custo para os cofres públicos com eventuais desapropriações, que geralmente vêm acompanhadas de necessidade de indenização aos atingidos.
A relação entre a decisão do STF e a possível aprovação de um Projeto de Lei (PL) sobre o tema é motivo de divergências entre juristas. De um lado, há a interpretação de que uma nova lei regulamentando o marco temporal tornaria sem efeito a decisão do STF. De outro, há especialistas que entendem que a interpretação da Constituição pela Corte está acima de qualquer PL que venha a tratar do tema. Neste sentido, a eventual aprovação do projeto seria inócua.
Além de discussões técnicas, o tema ganhou relevância no debate ideológico nos últimos anos. O ex-presidente Jair Bolsonaro se orgulhou de não demarcar nem um centímetro de área indígena em quatro anos. No atual governo, Lula já prometeu oficializar a posse de novas terras e a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, espera a homologação imediata de 14 processos de demarcação.
O tema seguirá dividindo opiniões. A despeito destas divergências, urge que cada processo seja analisado com rigor, para evitar injustiças contra indígenas que eventualmente podem ter sido expulsos de suas terras, mas também para assegurar direitos a quem as adquiriu e hoje produz alimentos que impulsionam o crescimento do país.