Com risco de prejuízo financeiro e dano para sua imagem, o Carrefour e seu CEO, Alexandre Bompard, se retrataram sobre afirmações sem provas sobre a qualidade da carne do Mercosul.
Foi um pedido de desculpas considerado "fraco", não sem razão. O trecho "lamentamos muito que nossa comunicação tenha sido recebida como questionamento de nossa parceria com a produção agropecuária brasileira ou como uma crítica a ela" soa como aqueles clássicos pedidos de desculpas "a quem tenha se sentido atingido". O problema não foi a recepção, foi a emissão.
Estava escrito na carta de Bompard "o risco de inundação do mercado francês com carne que não atende às suas exigências e normas". E foi nos dias seguintes a essa polêmica que o governo francês submeteu ao parlamento uma consulta sobre o acordo Mercosul-União Europeia que reforçou a oposição ao acerto, mas pode não ter blindado o avanço das negociações.
Foi durante os debates sobre essa consulta que o deputado Vincent Trébuchet fez uma afirmação que mostra a gravidade do dano à imagem do Mercosul cultivado por governo, empresas e parlamentares franceses:
— A realidade é que nossos agricultores não querem morrer e nossos pratos não são latas de lixo.
Trébuchet é da União das Direitas pela República (UDR), mas a rejeição ao acordo foi da extrema direita à esquerda radical. Houve 484 votos favoráveis e apenas 71 contrários à posição do governo de Emmanuel Macron, que tenta barrar o acordo.
O resultado não tem impacto nas decisões da União Europeia. Mas se por um lado reforça a resistência ao avanço, pode não ser efetiva para barrá-lo. O objetivo do governo era ter apoio unânime no Parlamento. Não conseguiu.
Mas os dois episódios envolvem um fenômeno curioso: tanto no Brasil quanto na França, o protecionismo e a reação a barreiras desleais quebraram, ao menos por alguns dias, a polarização política. O nacionalismo se impôs a outros "ismos". A coluna não tem certeza de que isso seja positivo. Mas não pode deixar de reconhecer o sinal.