Ainda que boa parte dos rumores que cercaram o Brics nos últimos dias não passem disso - como a suposta adesão do Afeganistão -, o bloco do "sul global" flerta com um conceito antípoda ao de sua criação.
Criador do acrônimo, o britânico Jim O'Neill deve estar com os cabelos em pé nesta semana de cúpula de Kazan, na sugestiva região russa do Tartaristão. O economista do Goldman Sachs viu no crescimento robusto de Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul na primeira década deste século um sinal de progresso econômico - que costuma embutir avanço civilizatório.
A Rússia virou o país que ataca nações soberanas sem ser provocado, a China provoca temores de desaceleração global, o Brasil tenta deixar a imagem de pária no passado e na África do Sul o legado de Nelson Mandela já não tem a mesma força.
Seria mais do que suficiente para duvidar do futuro desse aglomerado de países tão distintos, mas ainda há 34 candidatos a ampliar o potencial de encrenca, como Venezuela e Nicarágua, que o Brasil quer barrar.
O conceito "sul global" é legítimo, como era promissor o potencial das potências emergentes. Mas adesões mais recentes, como as de Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, aumentaram o déficit democrático do bloco mesmo tendo ampliado seu potencial econômico.
Ao presidir o Brics, em 2025, o Brasil tem chance de buscar uma forte inflexão democrática e civilizatória. Não por Jim O'Neill, mas pela maior quantidade de população representada por um bloco econômico no planeta.