Sebastián Risso é diretor-executivo da Uruguay XXI, agência pública federal que atua na promoção de exportações, na atração de investimentos e na difusão da imagem do país - missões semelhantes às da Agência de Promoção de Exportações (Apex-Brasil). Em Porto Alegre para participar da Expointer e como escala de um grande evento de exposição da "marca Uruguai" em São Paulo, Sebastián relatou à coluna que startups uruguais vão operar no Instituto Caldeira, com proposta de complemento com foco no Exterior ao bom trabalho já feito aqui, ainda focado no mercado doméstico.
O que o Uruguai busca no Rio Grande do Sul?
Temos relação forte com o Rio Grande do Sul. Além do turismo e das exportações, estamos avançando em inovação. O Estado e todo o sul do Brasil estão trabalhando muito bem nessa área, como nós. Neste ano, passamos a trabalhar com Instituto Caldeira, Tecnopuc, Assespro, houve missões das duas partes. O Uruguai tem um programa chamado Uruguay Innovation Hub, criado há cerca de um ano. Foi construído em um campus, uma espécie de Caldeira, só que menor, no parque de inovação do Latu (Laboratório Tecnológico do Uruguai), em Carrasco (bairro de Montevidéu onde fica o aeroporto).
É publico ou privado?
Público-privado. O programa é público, como o Uruguay XXI. Foi feito um chamado internacional para aceleradoras de startups e foi escolhida uma de Israel, em parceria com uma incubadora do Uruguai.
Não havia uma aceleradora antes?
Não, nenhuma. Depois, há a questão dos matching funds (fundos de contrapartida), em que o governo investe com participação de fundos de investimento estrangeiros ou de capital de risco, em startups uruguaias ou regionais que se instalem no Uruguai. Vamos trabalhar em três segmentos: deeptechs (desenvolvimento de patentes), biotechs e cleantechs (tecnologias limpas). Trabalhamos juntos, Uruguay XXI, Uruguay Innovation Hub e ANI (Agência Nacional de Inovação). Viemos ao South Summit no ano passado e neste ano, fomos à Web Summit (no Rio), fomos à South Summit em Madrid, Gramado Summit, que vai ter uma edição em Punta del Este em setembro. Temos empresas que já estão falando com o Caldeira para startups uruguaias terem um pé no Brasil.
Quando criamos uma empresa, pensamos em exportar serviços ou produtos. Aí vemos sinergia, porque encontramos brasileiros que dizem: 'bem, não pensava muito em ir para fora'.
As startups uruguaias viriam para ter um espaço no Caldeira?
Sim. O Brasil é um continente, e as startups brasileiras estão focadas no mercado nacional. No Uruguai e em muitos países, startups nascem pensando globalmente, em exportar. Temos mentalidade e legislação. Quando criamos uma empresa, pensamos em exportar serviços ou produtos. Aí vemos sinergia, porque encontramos brasileiros que dizem: 'bem, não pensava muito em ir para fora'.
O que o Uruguai tem a oferecer a negócios brasileiros?
Uma série de vantagens. Não se paga impostos para exportar serviços de tecnologia, por exemplo. Se a empresa está em uma zona franca também tem zero imposto. Temos a primeira, Zona América, de 1987. E na cidade de Montevidéu há edifícios dedicados a zonas franca, como duas torres ao lado do Montevideo Shopping, em Pocitos. Outra é Aguada Park, ao lado da torre da Antel (estatal de telefonia uruguaia), no porto. E tratamos empresas estrangeiros exatamente igual às nacionais, para efeito de concorrência pública inclusive.
Uma empresa brasileira que atua no Uruguai pode, se quiser, levar o dinheiro que ganhou para o Brasil. É só pagar o imposto, ao redor de 7%.
Que empresas essa política já atraiu?
Temos uma unidade da Pepsico (dona da marca Pepsi), que tem só oito plantas no mundo de produção do concentrado de suas bebidas, e uma é em Colonia del Sacramento. E temos um Microsoft New Labs, que tem só três unidades fora dos Estados Unidos, uma em Xangai, outra em Munique e outra em Montevidéu. É um laboratório aberto, focado em encontrar soluções para empresas. Temos livre distribuição de capital. Uma empresa brasileira que atua no Uruguai pode, se quiser, levar o dinheiro que ganhou para o Brasil. É só pagar o imposto, ao redor de 7%. E mesmo assim, mais de 40% do investimento estrangeiro no Uruguai é reinvestimento das que já estão aqui e querem ficar. E quase toda a energia que usamos é renovável, hidrelétrica, eólica e fotovoltaica. Empresas que atuam aqui obtêm certificado que comprova isso, que serve para buscar financiamento na Europa, por exemplo, mais barato.
Então os negócios se mantém?
Fizemos uma pesquisa no ano passado para saber por que as empresa se instalaram no país e 84% responderam que o clima de negócios no país é satisfatório ou muito satisfatório. E falam na estabilidade, em regras claras, leis de longo prazo, políticas de Estado que existem. Todas essas regras de zonas francas, de promoção de investimentos, passaram por muitos governos de orientações políticas diferentes. Ninguém pensa em mudar isso.
Isso dá certa inveja aos brasileiros...
Outro caso concreto de políticas de longo prazo é o Ceibal, criado em 2007, que propunha que cada criança tivesse um laptop. Uruguai foi o primeiro país do mundo com implementação total. Foi implementado por um governo de esquerda, da Frente Ampla, e quando mudou para outro, de centro-direita, a avaliação foi de que as coisas boas deveriam ser mantidas e aperfeiçoadas. Foi o que aconteceu, e hoje é possível ver crianças no campo, às vezes literalmente em cima do cavalo, tendo aulas de inglês com um professor que está em Montevidéu, ou outra cidade, e trabalhando em programação, robótica.
Colaborou João Pedro Cecchini