A morte de Abilio Diniz, na noite de domingo (18), aos 87 anos, pegou muita gente de surpresa porque o empresário havia transformado a vida saudável em um espécie de lado B do empresário ousado e do executivo famoso.
Um dos mais conhecidos homens de negócios do Brasil, Diniz tem uma trajetória cheia de altos e baixos, além de reviravoltas que ilustram a história recente do país. Para além da economia, porque inclui até um sequestro com direito ao qualificativo de "cinematográfico".
Em um país com diferenças marcantes entre o cenário dos pequenos e dos grandes negócios, Diniz conheceu os dois universos, como filho do fundador de uma pequena confeitaria chamada Pão de Açúcar e dono de um império de varejo que foi alvo de disputa internacional.
Em um tempo em que imigrantes não são mais vistos por muitos como pessoas empreendedoras buscando oportunidades, é bom lembrar que o empresário que marcou a história do país era filho do português Valentim dos Santos Diniz (1913-2008), que veio ao Brasil para começar um negócio que colocaria o Brasil na mira de gigantes.
Da confeitaria nasceu um supermercado, que foi abrindo e comprando várias outras lojas até que a microempresa familiar virou a maior empresa de vendas a varejo na América do Sul em 1971. Amigo do então ministro Mario Henrique Simonsen, Diniz chegou a integrar o Conselho Monetário Nacional (CMN), hoje reservado apenas a titulares da Esplanada.
Favorecido pelo "milagre econômico" da ditadura, na redemocratização virou alvo dos "fiscais do Sarney", acusado de remarcar preços de forma indevida e sonegar óleo de soja. Depois do fracasso do Plano Cruzado, Diniz viu outro amigo no Ministério da Fazenda, Luiz Carlos Bresser-Pereira.
Em 1989, foi sequestrado em meio a uma onda desses crimes. Antes dele, haviam sido capturados Antonio Beltrán Martinez, vice-presidente do Bradesco, em 1986, e o publicitário Luiz Salles, da Salles Interamericana, em julho do mesmo ano em que Diniz foi feito refém. Ficou 153 horas em cativeiro, e quando foi libertado pela polícia, fez uma frase de manual:
— Foram os piores dias da minha vida, mas passou.
O grupo que havia saltado da "padaria do português" a referência latino-americana foi abalado pelo próximo plano econômico: com o confisco da poupança, seguido de recessão no governo Collor, Pão de Açúcar quase entrou em concordata. Conseguiu evitar reduzindo seu tamanho à metade. Foi a primeira vez em que Diniz buscou uma saída no mercado internacional, mas não teve sucesso.
Mesmo menor, o grupo foi palco de uma intensa disputa por sucessão, com questionamento à gestão. Depois de cerca de dois anos de briga pública, o primogênito comprou a parte dos irmãos e, em seguida, decidiu vender ações do grupo. Em 1999, o grupo francês Casino comprou 25% do total do capital do Pão de Açúcar. Seis anos depois, foi a globalização atravessou seu caminho e o Casino ficou com o controle do GPA.
Diniz ainda ficou na gestão, chegou a comprar Casas Bahia e Ponto Frio - que ainda hoje passam por sucessivas reestruturações - mas acabou vendo o Casino ficar com 100% da marca criada pelo pai. Era 2012, o tempo dos "campeões nacionais", e ele chegou a tentar esboçar uma reação com ajuda do BNDES, que acabou desistindo da operação. Foi acusado de tentar um "golpe de Estado corporativo".
Nos últimos anos, Diniz se focou na Península Participações, empresa de investimentos da família que movimentava o capital da venda de seus negócios, outra marca temporal para várias outras famílias brasileiras. Por meio do Instituto Península, também tinha projetos na área do esporte - uma obsessão do homem que foi um menino acima do peso que sofria bullying - e investia em educação - uma mensagem final do empresário que foi um homem de todos os tempos.