No mesmo dia em que o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmava, na Suíça, que "a mudança de ambiente é perceptível" em relação ao Brasil (para melhor), o embaixador da Alemanha no país, Heiko Thoms, advertia em Porto Alegre:
— É impossível avançar no acordo União Europeia-Mercosul com esse nível de desmatamento na Amazônia.
Thoms fez palestra em reunião-jantar da Câmara Brasil-Alemanha no Rio Grande do Sul (AHKRS) na quinta-feira (26) e fez questão de incluir o tema em sua primeira manifestação, sob a forma de um apelo. Relatou que há uma "guinada cada vez mais crítica" na Europa à formalização do acordo, devido ao crescente desmatamento na Amazônia:
—A Alemanha continua a apoiar o acordo, mas no país e em toda a Europa, o debate tem sofrido uma guinada cada vez mais crítica. Investidores, setores da economia e consumidores têm expressado preocupação. Não podemos ignorar esses receios e simplesmente seguir com os negócios. Avanços concretos e comprováveis em termos de sustentabilidade são, portanto, imprescindíveis para o apoio ao acordo na Europa. Embora estejamos, aqui, longe da Amazônia, gostaria de enfatizar o quanto o potencial das nossas parcerias são afetados pela questão do desmatamento, também aqui, no sul do Brasil.
Ainda no discurso preparado, Thoms destacou a posição de destaque do Brasil em muitos setores relacionados à sustentabilidade, como a "matriz energética verde", e insistiu:
— O Brasil tem potenciais enormes na área de sustentabilidade, ofuscados por índices de desmatamento altos que, infelizmente, continuam a crescer. É ainda ainda mais lamentável que uma minoria criminosa enriqueça em prejuízo da grande maioria de produtores. Isso tem de acabar, e estamos dispostos a prestar apoio por meio da cooperação. Mas, para isso, precisamos de avanços e sinais claros de vontade política. Do contrário, as resistências políticas ao acordo tendem a se fortalecer e dificultar sua conclusão.
O embaixador ainda pediu a contribuição de Estados e municípios para a resolução do problema:
— Tenho certeza de que o Estado do Rio Grande do Sul e as empresas daqui, como importantes exportadoras de produtos agroindustriais, têm grandes interesse na conclusão do acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Estamos dispostos a estabelecer com o Brasil uma parceria aprofundada, que vá além da estrita cooperação já existente hoje, que dissolva obstáculos e libere benefícios a ambas as partes.
Já na segunda parte do encontro, Thoms recebeu uma pergunta sobre as "narrativas" a respeito do desmatamento na Amazônia, que não corresponderiam à realidade. Diplomaticamente, voltou a acentuar o potencial do Brasil para negócios sustentáveis e afirmou:
— O Brasil é o quarto maior poluidor do mundo, e essa poluição não decorre da matriz energética, mas vem do desmatamento. As queimadas são a primeira fonte desse problema. Essa é uma vantagem para o país, que poderia acabar com isso rapidamente. Já fez uma vez, entre 2004 e 2012. O conhecimento para acabar com isso existe. Não vejo vantagem em não fazer isso para o Brasil. Só tem desvantagem, porque a reputação do país sofre.
Thoms fez questão de dizer, ainda, que a questão ambiental, na Europa, não é um tema "da esquerda". Permeia todos os setores da sociedade, partidos de todas as tendências e, principalmente, o cidadão comum. Relatou que, ao comprar um carro e mencionar que era embaixador no Brasil, o vendedor até esqueceu a venda e passou a conversar sobre a destruição da Amazônia.