Depois da novela da desoneração, mais uma indefinição de muitos capítulos e ainda sem final feliz envolve a relação do governo Bolsonaro com o universo empresarial.
Desta vez, o desfecho em aberto é o do chamado "Refis do Simples", oportunidade para que pequenas e microempresas renegociem tributos federais relativos, depois de arrecadações mensais recordes e até um raro superávit primário em novembro.
O novelão começou com o veto do presidente Jair Bolsonaro ao Refis do Simples. O apelido se refere ao Programa de Reescalonamento do Pagamento de Débitos no âmbito do Simples Nacional (Relp), que permitiria parcelar em 15 anos dívidas em atraso com a União, além de desconto em juros e multas das dívidas em atraso.
A recomendação para o veto veio do Ministério da Economia, pelo mesmo motivo das dificuldades com a desoneração da folha de pagamento: não há previsão no orçamento para a renúncia tributária. Obviamente, a repercussão foi negativa. Embora o Brasil tenha um mau histórico, de excesso de perdões de dívida, que desestimula os bons pagadores, se há um momento e segmento que justificam o que deveria ser exceção, são estes: pandemia e pequenos negócios.
Desde então, já teve de tudo: comentário "vazado" de Bolsonaro reclamando da recomendação, aviso de que o Congresso vai derrubar o veto, anúncio de medida provisória para permitir adesão e desmentido sobre essa iniciativa. Muito barulho por nada. Até o sexto dia útil de 2022, não há solução à vista. É o desgoverno em ação.
Na avaliação do relator do projeto na Câmara, Marco Bertaiolli (PSD-SP), a renúncia fiscal envolvida seria ao redor de R$ 500 milhões em 2022, por envolver apenas valores de multas, juros e encargos, não o valor total do endividamento. As dívidas totais são estimadas em até R$ 50 bilhões. Em frase emblemática, Bertaiolli definiu:
— Ocupar o governo agora com essa lambança com certeza custa mais que esses R$ 500 milhões.
O universo potencial de empresas favorecidas é de 18,9 milhões de pequenas e microempresas. Desse total, cerca de 350 mil, conforme o Sebrae Nacional, podem ser excluídas do Simples Nacional ainda em janeiro, porque a inadimplência embute a exclusão automática do regime tributário especial. Com a indefinição, deverá ser preciso adiar o prazo de adesão ao Simples, que terminaria no próximo dia 31.
Nesta segunda-feira (10), em entrevista a uma rádio, Bolsonaro afirmou que a saída vai depender do Congresso: prometeu uma "solução parcial" ainda para o mesmo dia, mas afirmou esperar uma solução definitiva dos parlamentares, o que significa que o suspense só vai terminar a partir de 2 de fevereiro, fim do recesso parlamentar:
— Pretendemos uma solução parcial agora e com a volta do Parlamento, tenho certeza que o Parlamento vai derrubar o veto.
Neste caso, parece não se aplicar a frase "é a economia, estúpido", consagrada pelo consultor político de Bill Clinton, James Carville, para se referir à importância da sensação de conforto no bolso da população em processo eleitorais. O que importa, para Bolsonaro, é não correr o risco desrespeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para não ameaçar sua candidatura. A prioridade é a tentativa de reeleição. A solução para problemas que envolvem a sobrevivência dos negócios e a manutenção de empregos vem depois.