Depois da aprovação da PEC dos Precatórios na Câmara dos Deputados em segundo turno, o mercado reage, nesta quarta-feira (10) como se nada tivesse acontecido: neste início de tarde, a bolsa sobe 1,3% e o dólar recua 0,47%.
Mas não era o fim do mundo, inclusive para investidores e especuladores? Era. O conceito de fim de mundo foi atualizado. Depois da reação negativa na bolsa e no câmbio, o governo Bolsonaro indicou que, sem a PEC, o Auxílio Brasil seria pago com benefício mínimo de R$ 400 até o final de 2022 como despesa emergencial. E aí, o céu seria o limite.
Entre o ruim e o ainda pior, o mercado abraçou o mal menor. Analistas evitam até falar muito no assunto, para não "passar recibo" em relação a uma medida que vai contra tudo o que disseram nos últimos anos. Mas o tom predominante nos comunicados a clientes é um constatação de estragos com danos supostamente controlados.
No boletim de abertura de mercado do day after à aprovação completa na Câmara, Alvaro Bandeira, economista-chefe do banco digital Modalmais, lembra que, apesar de a PEC ter sido aprovada em segundo turno, foi mantida a "regra de ouro, que não permite que o governo se endivide para cobrir gastos correntes". E comenta: "menos mal".
Na sexta-feira (5), depois de uma manifestação do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o tom havia sido assim: "o presidente da Câmara falou a verdade, dizendo que não há alternativa que não seja furar o teto de gastos para implantar o programa Auxílio Brasil. Foi além, entendendo que os mercados se movimentam com previsibilidade e querem certeza para ajustar expectativas". Observou que "isso (previsibilidade) está faltando no momento", por isso havia "quedas acentuadas".
Então, a reação relativamente calma não se trata exatamente de aprovação ao furo no teto. Trata-se de constatar que esse é o nome do jogo, e poderia ser assim ou assado, mas sairia o benefício de R$ 400 que serve às pretensões eleitorais de Jair Bolsonaro. E, claro, a partir do momento em que constatou que a alternativa seria pior, o mercado fez com o furo no teto uma espécie de contrato "stop loss" (quando o comprador de ações estabelece um limite de perda que suporta, acima do qual coloca o papel em venda): até aqui, aceitamos. Mais, não.
Agora, é preciso lembrar do seguinte: o mercado ajustou suas projeções para pior — dólar, inflação e Selic mais altos, PIB mais baixo — e segue a vida, porque tem ótimos mecanismos para se proteger da perda de valor do real. Os mais pobres não têm acesso aos mecanismos financeiros que representam um escudo contra o dragão que cospe fogo no dinheiro. É quem vai pagar a conta.
Com a nova surpresa negativa com o IPCA, que veio muito acima das projeções do mercado, já se calcula o tamanho dessa conta. Étore Sanchez, economista-chefe da corretora Ativa, avalia que o Banco Central "terá que se mostrar mais austero para buscar a convergência, a fim de mostrar o compromisso com o regime de meta de inflação que vem sem colocado em descrédito". Em números, passou a projetar elevação da Selic em 2 pontos percentuais na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de 8 de dezembro. Em fevereiro, projeta mais uma dose de 2 pontos percentuais, além de mais uma de 1,5 ponto em março, o que levaria o juro básico a 13,25%. É a conta chegando.