Para anunciar uma inesperada reunião da Comissão Geral da Câmara dos Deputados, seu presidente, Arthur Lira (PP-AL), resolveu adotar o comportamento do presidente Jair Bolsonaro — que acabara de ser moderado pela Declaração à Nação — e reabastecer a economia de incerteza.
Na noite de segunda-feira (13), publicou um tuíte em que faz ponderações muito pertinentes sobre o alto preço dos combustíveis, mas termina com uma frase que soou como ameaça: "A Petrobras deve ser lembrada: os brasileiros são seus acionistas".
De fato, há muitos brasileiros que são acionistas diretos da estatal de petróleo, e todos os contribuintes são sócios indiretos ao ajudar a sustentá-la. Mas ao frisar a necessidade de "lembrar a Petrobras" dessa condição, Lira dá um xeque-mate na estatal, mais especificamente na sua política chamada paridade de preços de importação (PPI, leia mais abaixo).
Na véspera, sem novas ameaças verbais de Bolsonaro, a bolsa havia fechado em alta de 1,85%, em boa parte graças à valorização das ações da Petrobras de mais de 3% (ON 3,1% e PN 3,5%) e o dólar havia recuado 0,76%. Era o mercado "descontando" parte da tensão gerada por Bolsonaro no 7 de Setembro. Aí surgiu Lira para encher o tanque da incerteza. No final da manhã desta terça-feira (14), os papéis ordinários da Petrobras caem 0,93% e os preferenciais, 1,18%.
Um dos efeitos colaterais foi ressuscitar o debate sobre a privatização da estatal, considerada um "monstrengo" por boa parte da equipe econômica. A Petrobras, assim como o Banco do Brasil, é uma empresa pública de capital aberto, ou seja, com ações negociadas na bolsa de valores. Dessa forma, tem sócios tanto entre contribuintes quanto no mercado financeiro. Não é raro que os interesses desses dois grupos sejam opostos.
Sobre o BB, o ministro da Economia, Paulo Guedes, já disse que "não é tatu nem cobra". Descreveu assim as pressões sobre o então presidente da instituição, Rubem Novaes — que, não por acaso, já teve dois sucessores:
— Ele é superliberal, mas se apertar e falar: ‘bota o juro baixo’, ele: ‘não posso, senão a turma, os privados, meus minoritários, me apertam’ . Aí se falar assim: ‘bota o juro alto’, ele: ‘não posso, porque senão o governo me aperta’.
É exatamente a mesma situação da Petrobras: o interesse dos contribuintes é um, o dos acionistas, outro. E ainda tem como retrospecto o rombo estimado em US$ 40 bilhões com o represamento de repasses de preços nos governos petistas. Agora, abriu tanto as comportas que levou o litro da gasolina para R$ 7, pressionando a inflação.
Portanto, há espaço paras aperfeiçoamento da PPI da Petrobras. Mas ao brincar de xeque-mate com a estatal, o presidente da Câmara provoca o mesmo efeito inverso que Bolsonaro vinha causando: pressiona o dólar e, em consequência, o preço dos combustíveis. Até a bolsa abrir, o presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, já havia dado seu recado à parte mais influente dos sócios da empresa:
— A melhor contribuição que a Petrobras pode dar à economia brasileira é ser uma empresa forte, que faz investimentos. Há uma governança rigorosa na empresa, não tem espaço para aventura.
Diante da insistência dos parlamentares sobre o papel da Petrobras no freio à inflação, Silva e Luna voltou a reforçar:
— Preço tabelado não é real, acaba com qualquer investimento. Os países que fizeram isso (controlar preços) faliram.
Lira abriu a caixa de Pandora e pode não conseguir recolher todos os impactos que provocou. Embora a aprovação seja pouco provável, o deputado Paulo Ramos (PDT-RJ) já pediu a abertura de uma CPI da Petrobras. Isso lembra algo a alguém?
A política da Petrobras
Para reajustar o preço nas refinarias, a Petrobras adota um cálculo chamado Paridade de Preços de Importação, adotado em 2016, no governo Temer. A intenção é evitar que a estatal acumule prejuízo com por não repassar aumentos de produtos que compra do Exterior, tanto petróleo cru quanto derivados, como a gasolina. A fórmula inclui quatro elementos: variação internacional do barril do petróleo, cotação do dólar em reais, custos de transporte e uma margem definida pela companhia, que funciona como um seguro contra perdas.