Luiz Eduardo Barata Ferreira era diretor-geral do Operador Nacional do Setor Elétrico (ONS) em 2019, quando foi extinto o horário de verão. Relata que havia pressão pela extinção há dois anos, mas sempre se opôs.
— É um Gre-Nal, como vocês dizem aí (ele é carioca). Um contingente gosta muito, como eu, que gosto e não entendo porque tem gente que não gosta — brinca.
Falando sério, Barata Fonseca considera "imprescindível" ao menos avaliar a volta do fuso especial. Pondera que, nos últimos anos, a economia caiu com o aumento maciço no uso de ar-condicionado à tarde. O maior consumo deixou de ser no horário de ponta para se deslocar para o meio da tarde, explica:
— O ganho, que era considerável por economizar geração térmica, passou a ser pequeno.
Está na hora de retomar o horário de verão?
Na medida em que o tempo foi passando, além de contribuir para a economia de energia elétrica, o horário de verão beneficiava o turismo e o comércio. Sempre defendi, desde que começou o questionamento, que o tema extrapolava o setor de energia. Era preciso olhar o todo. Entendia que, mesmo com pequena redução no consumo, deveríamos manter o horário. A questão foi empurrada em 2017, 2018, e em 2019, no governo Bolsonaro, houve a extinção. Agora, defendo, há alguns meses que, como estamos contando megawatt, toda a economia é positiva. A questão já deveria ter sido avaliada há mais tempo. Mas minha tese é mais 'tem de estudar' do que 'tem de voltar'. Pode ser que, pela postura negacionista do governo, nem tenha ocorrido essa avaliação, estou afastado do ONS. Na situação em que estamos, qualquer ganho que se tenha seria positivo. Mas vai ser difícil fazer uma movimentação agora, porque tem implicações além do Brasil, mudam horários de voo, compromissos internacionais.
Não daria tempo até outubro, mas não seria possível adotar a partir de novembro, por exemplo, já que os problemas vão além do fim do período seco?
Sim, é inviável voltar na segunda semana de outubro, como foi fixado em decreto, para resolver a novela de todo ano que era 'quando vai começar o horário de verão'. Mas pode ser mais tarde. O imprescindível é que se faça uma avaliação. Toda economia será considerada e bem-vinda, porque a crise deve se estender para 2022. Há estudos de qualidade, mas são todos feitos sobre premissas, e muitas não estão se confirmando. Têm aparecido cenários piores.
Há perspectiva de fazer desligamentos programados, caso o ONS reconheça que não vai conseguir atender a carga, ou não fazer e, como a folga é pequena, vir a ter desligamentos não programados.
Agora, o maior temor não é o racionamento, mas o risco de interrupções, os chamados apaguinhos?
Sim, entre outubro e novembro, há risco de o sistema ficar muito no limiar, ter pouca geração para atender a carga em determinadas áreas. Então, há perspectiva de desligamentos programados, caso o ONS reconheça que não vai conseguir atender a carga, ou não fazer e, como a folga é pequena, vir a ter desligamentos não programados. A preocupação com racionamento é mais para 2022, dependendo da quantidade de chuva no verão.
O desligamento programado tem consequências mais previsíveis, não?
Sim, porque se sabe o que está desligando e quando vai voltar. Para esses casos, cada distribuidora tem um plano de contingência específico. Conhecem bem o sistema. A interrupção é desagradável para todos, mas se evita desligamento de hospitais, delegacias de polícia. Não estou dizendo que isso vai acontecer, mas há risco. Dadas as condições frágeis, é bom evitar desligamentos não programados, porque demora mais a religar e existe risco de que, quando ocorrerem, afetem regiões maiores. E caindo sem programação, pode afetar hospitais, delegacias. Um desligamento localizado é ruim, mas de menor gravidade e pode ser contido em pequenas regiões.
Normalmente, são desligados grandes consumidores, até porque costumam ter backup (sistemas alternativos, como grupos geradores), outras formas de alimentação para o período de interrupção.
Como são as bases desses planos de contingência, desliga-se antes grandes consumidores de energia, como indústrias eletrointensivas?
As distribuidoras têm esses planos, sabem o que precisam fazer. Normalmente, são desligados grandes consumidores, até porque costumam ter backup (sistemas alternativos, como grupos geradores), outras formas de alimentação para o período de interrupção.
O que é possível fazer para reduzir esse risco no futuro?
Neste momento, temos de olhar com muito cuidado a crise deste final de ano. Depois, com muita atenção, 2022. Depois, é fundamental reavaliar toda a estrutura de operação e comercialização. A mudança de características do sistemas, associada a mudanças climáticas, exigem que revisemos o modelo do sistema. É uma necessidade que defendo desde 2015. Adotamos uma série de medidas, mas ainda pontuais. Temos de olhar o todo, como feito em 1998 e depois em 2004. Se não, há o risco de enfrentar uma situação como esta a cada ciclo de cinco anos. Tivemos uma grande crise em 2014, outra no ano passado no Sul.