O novo adiamento da votação do polêmico projeto de mudança no Imposto de Renda que afeta pessoas e empresas pode não determinar o naufrágio definitivo da proposta, mas ameaça aumentar o custo de aprovação para o governo Bolsonaro, que já está alto.
Sob o peso de críticas no setor produtivo, protestos de Estados e municípios e muitas queixas da classe média, o tema foi retirado de pauta, na noite de terça-feira (17), resultado de consensos inesperados.
O líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR), disse que ia "concordar com a fala" do oposicionista Marcelo Freixo (PSB-RJ) de que, na dúvida sobre perdas a municípios, era melhor ter "mais tempo para estudar o texto".
Na equipe econômica, o puxa-estica para tentar equilibrar o início da cobrança de tributo sobre lucros e dividendos de sócios com a redução da alíquota de IR para empresas vinha provocando arrepios. O ministro da Economia, Paulo Guedes, demonstra irritação com o que chama de "lobby" contra o projeto. Agora, há certa sensação de alívio, porque a falta de avanço evita renúncias fiscais que crescem desde o primeiro parecer do relator Celso Sabino (PSDB-PA).
Não funcionou nem a tentativa do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) de cooptar a Confederação Nacional dos Municípios (CMN), ampliando repasses ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em até R$ 6,5 bilhões. Para sondar o futuro da proposta, a coluna consultou Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal e um dos autores da reforma ampla que foi descartada na Câmara por Lira e Guedes, que ainda teme o resgate do projeto fatiado:
— Da forma como está, acho que não passa, mas há o risco de mais concessões para viabilizar a aprovação, importante para o governo do ponto de vista eleitoral, por conta da correção da tabela do IRPF e da criação de fontes para compensar o aumento de despesas resultante da criação do Auxílio Brasil.
Na terça-feira (18), Federasul, Fiergs, Fecomércio, Farsul e OAB-RS encaminharam ofício à bancada gaúcha manifestando contrariedade à iniciativa.
— Não se trata de reforma tributária e sim de uma proposta que traz aumento de carga, porque propõe a tributação de lucros e dividendos e traz maior complexidade para o sistema —, argumentou o presidente da Federasul, o tributarista Anderson Trautman Cardoso.
Na iminência da votação, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) elevou o tom crítico, considerando "inaceitável" a aprovação da mais nova versão do substitutivo ao projeto 2.337/2021. Conforme a CNI, o novo texto aumenta a tributação sobre investimentos produtivos de 34% para, no mínimo, 39,2%, com risco de chegar a 40,4%, a partir de 2023.
No detalhe, o pesquisador do Ipea Sergio Gobetti deu um exemplo muito prático das distorções provocadas pelas mudanças no IR. Uma empresa com um só sócio, que fatura R$ 4,8 milhões terá redução da carga tributária de 19% para 16%. Outra, que fatura R$ 4,9 milhões e tem cinco sócios, enfrentará elevação da carga de 19% para 31,5%.