A medida provisória anunciada pessoalmente pelo presidente Jair Bolsonaro, que libera a venda de etanol de produtores ou importadores diretamente aos postos e cria a possibilidade de vender combustível de outros fornecedores em redes com bandeira própria, foi duramente criticada, nesta quinta-feira (12), pelo Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), que reúne as gigantes do setor no país.
Em nota, o IBP afirma que a venda de outros fornecedores em postos de rede "não traz benefícios em termos de preço e informação ao consumidor, mas aumenta os custos regulatórios e fiscais e cria uma desestruturação em um mercado bastante maduro e complexo".
A entidade ainda ressalta ter recebido o anúncio da MP "com surpresa", exatamente porque o tema já vinha sendo discutido no processo de revisão regulatório conduzido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP), que inclui, por exemplo, a venda de combustíveis por delivery, como a coluna registrou em julho.
Conforme a entidade, no Brasil, os postos de combustíveis já têm a opção de ostentar ou não marcas comerciais de distribuidora. Os chamados postos "bandeira branca" representam cerca de 47% do mercado, o que mostra a competição entre os modelos. Sobre a venda direta de etanol, o IBP diz não ter restrição desde que "com o devido tratamento tributário". A entidade menciona, em seguida, a necessidade de "combate à sonegação de R$ 24 bilhões anuais", ou seja, associa a mudança ao aumento de risco de não pagamento de tributos.
À coluna, a diretora de downstream do IPB, Valéria Lima, disse que a MP encaminha uma solução para o pagamento dos tributos federais (PIS/Cofins), mas deixa em aberto a solução para o ICMS. Detalha que o etanol é o único combustível que mantém dois elos de cobrança de tributos, na produção e na distribuição. Para os demais, tudo é recolhido nas refinarias.
— A venda direta era uma demanda antiga dos produtores de etanol, e a MP é até melhor do que uma proposta que tramitava no Congresso, mas sem resolver essa complexidade tributária, aumenta a possibilidade de sonegação. Não tem como fazer venda direta sem resolver a questão do ICMS.
Sobre a questão da venda de outros fornecedores em postos com bandeira, a executiva diz que "surpresa" é a melhor palavra para descrever a reação porque a MP altera a Lei do Petróleo para a adoção da medida, mas joga a regulamentação para a ANP, que já vinha tratando do assunto:
— Isso cria confusão no mercado, que hoje tem uma modalidade que funciona muito bem, com postos bandeira branca e postos bandeirados. Os dois concorrem entre si e também dentro de cada modalidade. Esse mercado já é aberto e competitivo, não ficou claro o que se quis com a MP.
Leia a íntegra da nota
"O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) defende a regra atual de funcionamento do mercado de revenda de derivados, que permite a convivência entre o modelo sem exclusividade de marca e o de exclusividade, o que assegura aos consumidores de combustíveis de todo o país a garantia de que os produtos da marca estampada nos postos tenham origem na distribuidora com a qual o revendedor mantém uma parceria comercial. Este ponto é uma premissa para uma concorrência transparente e justa.
Nesse sentido, o Instituto recebe com surpresa a Medida Provisória apresentada nesta quarta-feira (11.08), que abre possibilidade de comercialização de produtos de outros fornecedores em postos com marcas específicas, tendo em vista o atual processo de revisão regulatório sendo conduzido pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis).
Acreditamos que a proposta legislativa não traz benefícios em termos de preço e informação ao consumidor, mas aumenta os custos regulatórios e fiscais e cria uma desestruturação em um mercado bastante maduro e complexo.
No Brasil, os postos de combustíveis já têm a opção de ostentar ou não marcas comerciais de distribuidora. Os chamados postos "bandeira branca" representam cerca de 47% do mercado, o que mostra a competição entre os modelos.
A manutenção da fidelidade à marca exposta nos postos revendedores dá ao consumidor a certeza da origem dos produtos. O cliente tem o direito, assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor, de identificar a marca comercial da distribuidora com a qual se relaciona frequentemente e possui mais confiança nos produtos e serviços ofertados. Além das dificuldades operacionais de se segregar nos tanques e bombas os produtos de diferentes origens e a virtual impossibilidade de separar os serviços presenciais e digitais eventualmente agregados, a clareza de comunicação ao consumidor ficará comprometida.
O IBP reforça a necessidade de respeito às marcas em benefício dos consumidores e os contratos e modelos de negócios estabelecidos como pilar fundamental para a segurança jurídica e concorrencial necessárias para realização de investimentos e garantia de abastecimento do extenso território nacional.
Sobre a venda direta de etanol hidratado, o IBP não tem restrição à sua liberação desde que com o devido tratamento tributário que preserve a isonomia comercial e concorrencial entre os agentes econômicos, pilares para um mercado eficiente e saudável. A medida trata da tributação do PIS/Cofins, mas o regramento do ICMS ainda há que ser acertado pelos Estados da Federação.
O Instituto se manifesta também pelo papel fundamental da ANP para regular este importante setor por meio de processos regulatórios estabelecidos de modo transparente e continua acreditando que há prioridades para as evoluções regulatórias no setor, notadamente no que diz respeito ao processo de desinvestimento das refinarias da Petrobras, ao combate à sonegação de R$ 24 bilhões anuais e à inserção estruturada do aumento dos biocombustíveis na matriz de transporte."