Foi publicado na quarta-feira (16) o edital do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (clique aqui para ver o documento) que define as regras de criação de uma organização social destinada à pesquisa e ao desenvolvimento na área de semicondutores para substituir a Ceitec, extinta em dezembro passado.
Embora a possibilidade surja durante uma crise global no fornecimento de chips, que a Ceitec produzia na Lomba do Pinheiro, não há consenso de que o mercado identifique uma oportunidade.
O edital exige que os candidatos tenham "experiência prévia em gestão de atividades" relacionadas à Ceitec, e que o selecionado ofereça contrato de trabalho para, no mínimo, 50% dos atuais ocupantes do cargo efetivo de nível superior de especialista em tecnologia eletrônica avançada que atuavam na Superintendência de Produto, Pesquisa e Desenvolvimento. Em audiência pública anterior à publicação, o Mtic havia anunciado que essa OS terá dotação de R$ 80 milhões por quatro anos. Agora, os candidatos terão prazo de 45 dias para apresentar suas propostas.
Hernane Cauduro, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) no Estado, diz que a situação de escassez de semicondutores é "terrível" e embute "alto risco". Mas pondera que a tecnologia da Ceitec é "defasada":
– Nessa indústria, a evolução é muito rápida, o tamanho dos chips reduz um terço a cada dois anos. A estatal ficou parada, sem investimentos. Talvez alguém que assumisse esse papel poderia ajudar o agro, com o chip do boi, mas fica por aí.
Presidente regional da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Régis Hauber, detalha que a tecnologia do Ceitec é de 600 nanômetros, enquanto os chips mais simples hoje são fabricados com 50 nanômetros, os de celulares estão em 14, podendo chegar a cinco.
– A crise de semicondutores é relacionada à capacidade de fabricação, o que demanda investimentos altíssimos e ao menos dois anos para implantação. O movimento mundial é de mudar a geografia da produção de semicondutores e reduzir a dependência da Ásia, e sim, o Brasil poderia ser um novo player para esta produção.
Ricardo Reis, professor titular na área de microeletrônica da UFRGS, estranha a falta de interesse. Argumenta que a indústria de TI no Rio Grande do Sul tem perdido terreno por não conseguir competir com as empresas internacionais. E sustenta que é "ignorância" dizer que a tecnologia está obsoleta, porque um chip de elevador, por exemplo, não precisa ser de última geração:
– Não precisa ir de Ferrari ao supermercado fazer compras. Automóveis modernos usam chips com tecnologias anteriores à da Ceitec, por questão de tolerância a efeitos de radiação.
A próxima etapa da escolha de uma OS é a formação de uma comissão de seleção, que avaliará o alinhamento de cada proposta aos objetivos descritos, a experiência no segmento de microeletrônica, capacidade de adotar boas práticas de governança, entre outros critérios. A OS que assumirá parte das tarefas da Ceitec não pode ter fins lucrativos, o que significa que terá de reinvestir na atividade eventuais ganhos.
O principal ativo da Ceitec, a chamada "sala limpa" (ambiente controlado para evitar presença de partículas ou microrganismos que possam alterar produtos ou análises) deverá ser vendida pelo liquidante. Se a futura OS quiser usar o espaço, terá de negociar com o novo proprietário ou criar outra solução.